29 fevereiro 2008

Tudo Era Macedônia

I

Rosa traz para a cozinha uma bandeja com vários copos.
Um deles está quebrado.
Rosa pega esse copo quebrado, lava ele com todo o cuidado. Depois de enxugá-lo ela ensaia movimentos de esgrima como se o copo fosse a espada.

Rosa: Eu ainda te mato, sua puta!


II

Rosa tomando um sorvete em um estacionamento, ela passeia entre os carros. De repente ela avista Gabriel, vai em sua direção, dá um beijo na boca dele, ele parece bastante cansado. Eles entram no carro, Rosa na direção. Ela liga o carro e depois joga o sorvete na cara de Gabriel.


III

Rosa na cozinha segura o copo quebrado. Surgem na porta Sueli e Rafael.

Sueli: Estamos indo.

Rosa esconde o copo atrás de si. Sueli se aproxima para beijar Rosa. Gabriel entra na cozinha.


IV

Rosa e Sueli estão na parada de ônibus, que está bem lotada.

Sueli: Desde quando você também pega esse ônibus?
Rosa: Desde a semana passada, por quê?
Sueli: É que talvez ele não seja o melhor para você.
Rosa: Você tem alguma outra sugestão?
Sueli: Tenho, mas aí você vai ter que ir para outra parada.


V

Rosa no banheiro lavando sua mão, que está toda cortada. Jorra muito sangue. Gabriel está ao seu lado.

Minutos antes na cozinha:
Sueli abraça Rosa. Escuta-se o som de vidro quebrando. Rosa solta um forte grito de dor.


VI

Rosa está numa parada de ônibus sozinha.


VII

Rafael está varrendo o chão da cozinha e catando os pedaços de vidro do chão. Sueli está sozinha na sala. De repente Sueli começa a rir. Rafael surge e pergunta do que ela ri. Sueli não consegue responder, pois o riso é incontrolável.


VIII

Rosa fecha a torneira, Gabriel começa a fazer um curativo.

Sueli não consegue parar de rir.
Rosa aparece na sala com metade da mão enfaixada, ainda sangra um pouco.
Rafael e Gabriel ficam constrangidos com a situação: Sueli às gargalhadas e Rosa ali parada, apenas observando e com sangue escorrendo pelo curativo.


IX

Rosa e Gabriel deitados na cama de um hotel barato. Ele está deitado de barriga pra cima. Ela está de bruços e folheando uma agenda.
Rosa folhea os mapas no final da agenda.

Gabriel: Em que país você está?
Rosa: Na Macedônia.
Gabriel: Você sabia que um dia tudo foi Macedônia?
Rosa: Tudo o quê?
Gabriel: Tudo ué, tudo isso que você tá olhando aí.

Rosa rasga a página que tem o mapa da Macedônia. Gabriel observa espantado.
Rosa se levanta e entra no banheiro.


X

Gabriel está na porta do banheiro de sua casa.
Do outro lado da porta escuta-se o choro contido de Rosa.
Pingos de sangue estão espalhados pelo chão.


XI

No quarto de hotel Rosa está junto à janela olhando a rua pelas frestas da veneziana. Gabriel dorme de barriga pra cima.
No cesto do banheiro está o mapa arrancado por Rosa.
Ao lado da Macedônia está escrito a lápis:

“Sueli”


XII

Sueli e Rosa estão na parada de ônibus, que está lotada.
Rosa está com a mão enfaixada.

25 fevereiro 2008

Águas no Maracanã

O segundo tempo da final da Taça Guanabara (primeiro turno do campeonato carioca) fez chover água do céu e o Fogão, que esquentou o gramado e a cabeça do Mengão no primeiro tempo, se apagou nas próprias lágrimas.

Mengão vitorioso e Botafogo chora, isso mesmo, de novo! Chora jogador, técnico, presidente e todos com a mesma história: passaram a mão no glorioso.

Como rubro-negro de coração, estou longe de chorar, só alegria, ainda mais ver o que o Joel (técnico do Flamengo) fez, as alterações no segundo tempo simplesmente acuaram o Botafogo, que então vencia por 1x0. Cuca (técnico do Botafogo) simplesmente não acreditou no que viu e fez uma alteração aos 12 minutos, porque sentiu que a coisa ir ferver para o fogão.

15 minutos/segundo tempo. Penalti para o flamengo. Pensei: Otimo, mas vai ser um saco ouvir botafoguense reclamando da arbitragem, mais uma vez!

O zaguerio do Botafogo praticamente arrancou a camisa do zagueiro flamenguista Fábio Luciano, e o pior, na cara do juiz, que ao ver um jogador quase sem camisa e arremessado ao chão não teve dúvida, era dentro da área e era penalti!

Ibson, o craque, bate com perfeição e o Mengão empata!

Daí em diante teve expulsões, brigas, chuva, emoção atrás de emoção. E eu ali na frente da tela de um computador ouvindo o jogo pela Rádio Globo, nenhuma TV transmitiu em São Paulo, absurdo! Sem contar que o pay per view custa 60,00!!! Mas enfim, meu coração bate por ti mengão, vamos ouvir na rádio!

E pra completar a emoção, Joel, vou me permitir a liberdade e o exagero de chamá-lo de gênio Joel, colocou mais um atacante em campo: Diego Tardelli. Não deu outra, gol de Tardelli nos acréscimos! Mengão 2x1, de virada.

Flamengo campeão da Taça Guanabara e está na final do campeonato.

Jogo emocionante, nada daquelas coisas patéticas dos campeonatos europeus, onde tudo é muito certinho e vemos apenas milionários exercitando suas habilidades. Acredito no futebol da raça, do choro, da emoção, dos cartões vermelhos, dos erros do juiz, assim a gente sente o coração mais de perto e tem a certeza de estar vivo!

24 fevereiro 2008

Seja bem vindo ao encontro das águas



O encontro das águas é uma das principais atrações turísticas do Amazonas, onde o rio Negro, de águas escuras, encontra o rio Solimões, de águas barrentas.

O rio Solimões é nome do rio Amazonas desde que entra no estado do Amazonas, vindo do Peru, até o encontro das águas, em Manaus, a partir desse ponto até o oceano Atlântico ele passa a ser denominado rio Amazonas.

Para saber mais:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Encontro_das_águas
http://pt.wikipedia.org/wiki/Rio_Solimões
http://pt.wikipedia.org/wiki/Rio_amazonas

23 fevereiro 2008

Cícero - envelhecer

Os frutos da velhice, tenho dito e repetido, são todas as lembranças do que anteriormente se adquiriu. Ora, tudo o que é conforme à natureza deve se considerar como bom. Que há de mais natural para um velho que a perspectiva de morrer? Quando a morte golpeia a juventude, a natureza resiste e se rebela. Assim como a morte de um adolescente me faz pensar numa chama viva apagada sob um jato d'água, a de um velho se assemelha a um fogo que suavemente se extingue. Os frutos verdes devem ser arrancados à força da árvore que os carrega; quando estão maduros, ao contrário, eles caem naturalmente. Do mesmo modo, a vida é arrancada à força aos adolescentes, enquanto deixa aos poucos os velhos quando chega sua hora. Consinto de tão boa vontade tudo isso que, quanto mais me aproximo da morte, parece que vou me aproximando da terra como quem chega ao porto após uma longa travessia.

(Cícero, "Saber Envelhecer")

21 fevereiro 2008

Questionabilidade

Ela preparava o recheio.
Na janela um pequeno vaso a observava.
Sua dúvida estava não mais no modo de preparo, mas se a ocasião era realmente a mais apropriada para mostrar a sua grande invenção culinária.
O tormento da incerteza lhe consumia e num repente ela parou tudo. Ela não podia se dar ao luxo de um intervalo, os minutos consumiam o desgaste no relógio de parede. Mas era preciso pensar!

Após contar e nomear todos os presentes à mesa na hora do jantar, ela se deu conta de uma coisa: uma pessoa em especial merecia provar aquela nova receita. O motivo? Esperemos um pouco.

Volta à cozinha, recomeça o trabalho com dedicação espartana.

Pronto, está pronto. 20h.

Um banho bem tomado, perfume no corpo, roupas leves.

Dia seguinte.
Sentada no sofá vermelho de sua sala, tudo que ela investiga em sua memória é onde havia errado. Todos os ingredientes estavam certos, o modo de preparo poderia até ser diferente, mas com toda a sua experiência era impossível errar, mas ela errou.

Foram somente duas vozes que citaram a estranheza, a primeira ficou incomodada com a pimenta. Pimenta? Sim, isso mesmo, a pimenta. Mas enfim, era um prato de inspiração indiana...
A segunda pessoa disse que... Ah, esta segunda pesssoa era quem realmente deveria provar o novo prato, o motivo? Ela com certeza não iria gostar, qualquer que fosse o cardápio. Elas se odiavam, e tudo por causa de um cabelereiro. Raios! Mas por que ela estava naquele jantar? Sabe aquelas coisas de grandes amigos em comum? Pois é...
Voltando, o comentário foi que tudo estava aguado.
Se havia sinceridade nesse comentário? Sem dúvida! Ali sentada em seu sofá vermelho ela lembrava o olhar de sua inimiga na noite anterior, pura sinceridade.
Esse foi o maior tormento, ela queria ouvir uma única reclamação, e sentir falsidade, mas aconteceu o contrário. Além de uma pessoa neutra ter reclamado da pimenta, a sincera crítica de uma rival a fez desmoronar.

E agora? Pimenta e água, como isso estava em exagero?

Tudo que ela podia crer era que a TPM a afetava com toda a sua força naquele mês, perdera a medida das coisas.

(e foi tudo o que ela disse ao caixa do banco)

20 fevereiro 2008

Coletor e cobrador

Av. Paulista, manhã.
O ônibus pára no sinal. Eu estou sentado dentro desse ônibus, dois bancos para trás do cobrador.
Ao lado do ônibus está um caminhão de lixo.
O cobrador lê um jornal (que parece ser um daqueles distribuídos no metrô).
O coletor de lixo, pendurado na traseira do caminhão ao lado, se aproxima da janela do ônibus e fala ao cobrador:
- Que emprego bom esse hein!
O cobrador responde algo meio desconcertado. O coletor continua:
- Sai de casa e fala pra mulher que vai trabalhar e passa o dia passeando de ônibus.
O coletor solta uma risada. Um outro coletor, pele bem clara, olhos pequenos e pendurado na outra barra de ferro da traseira do caminhão, também sorri.
O cobrador ri e novamente responde algo meio desconcertado.
O coletor então diz que sabe que o trabalho do cobrador parece fácil, mas tem hora que a coisa aperta, fica difícil, com muita tensão. Em seguida forma na sua mão um revólver com os dedos. Na seuqencia ele completa:
- Deus é maior!
O cobrador responde que o trabalho do coletor também parece difícil. O coletor confirma dizendo que é bom por passear também, mas o cheiro, andar pendurado, risco de tontura na cabeça, e muitas outras coisas fazem o serviço mais duro, mas "Deus é maior".
O sinal abre.
Os dois trabalhadores se despedem, risos em seus rostos.
O ônibus vai mais rápido que o caminhão de lixo.
Penso: e o motrista do caminhão, como será?
Espero passar pela janela e quando vejo, lá está ele, um homem de meia idade manipulando um jornal (que parece ser um daqueles distribuídos no metrô) e o voltante de seu caminhão.

Futebol pela manhã

Futebol.
O brasileiro Mancini fez gol pela Roma na vitória contra o Real Madrid pela liga dos campeões.
Vi essa notícia em dois noticiários pela manhã, ambas narradas com um entiusiasmo pelo sucesso do futebol brasileiro.
Argh.

There will be blood

There will be blood é there will be blood.

A tradução não foi feliz para o recente filme de Paul Thomas Anderson, a expressão 'Sangue Negro' é até compreensível no filme, mas o título original é o tom do filme.

Filmaço, ele exploode na tela, um verdadeiro filme de cinema em tempos que muitos consideram que ver em casa ou no computador não faz a menor diferença. Os enquadramentos são cuidadosos para expor uma narrativa linear mas perpendicularizada com os elementos que compõem a vida ebuliçada do personagem interpretado por Daniel Day Lewis. O desenho de som do filme constrói um envolvimento perturbador, uma concepção rara de ser ver.

No início do século XXI trazer um enredo que se passa no início do século XX e sobre o petróleo, é por si só uma reflexão importante para pensarmos quais valores construíram o século passado e que herdamos numa selvageria individualista.