21 dezembro 2008

Cabelos castanhos com luzes [PARTE II]

Primeira ligação.
Do outro lado uma voz rouca de mulher atendeu muito rápido, Maria gaguejou um pouco no início mas logo falou o que queria com muita segurança.

Antes da segunda ligação refletiu sobre a noite anterior e percebeu uma coisa que talvez tenha lhe magoado.

No balcão de um bar repousava um copo de cerveja, na testa suor e na cabeça uma crise infernal. O estrangeiro que não era estrangeiro não parava de pensar em Maria, porém percebeu o quanto foi rude, após o beijo da praça não guardou nada dela, nem telefone, nem e-mail, nada! Era só o começo.

Segunda ligação.
Ninguém atendeu.

Terceira ligação.
A amiga de Maria atendeu e disse que não podia fazer nada, se a segunda ligação não atendeu é porque não havia ninguém.
Sua nuca suava novamente.

Duas mulheres de cabelos amarelos faziam suas unhas, as suas manicures eram jovens e franzinas. Um falante cabeleireiro massageava a cabeça de Maria do lado oposto do apertado salão. Um ventilador no canto refrescava levemente o ambiente.
Os longos cabelos de Maria agora eram curtos, chanel.
Maria saiu do salão carregando uma charmosa bolsa de pano.

Forte calor. Maria atravessou a cidade.
Colocou sua bolsa de pano sobre um balcão e iniciou uma negociação que demorou muito mais do que ela gostaria que tivesse durado.
Enfim conseguiu um bom dinheiro por seus cabelos. Eles despertavam muito o desejo. Mas agora era passado, seu cabelo estava chanel e pronto.

Maria resolveu dois problemas de uma só vez: dispensou a peruca da segunda ligação e conseguiu o dinheiro que precisava para o assunto da primeira.

A mulher de voz rouca recebeu Maria num apartamento muito aconchegante. Maria tinha imaginação, por isso criou um universo bem diferente para aquele apartamento, havia gostado da idéia de imaginá-lo com cores escuras e fortes, e também com muitos gatos circulando pelos ambientes. Porém aquele lar possuía paredes de cores claras e um cachorrinho meigo. A mulher de voz rouca lhe entregou um papel excessivamente colorido, Maria prontamente repassou o dinheiro a ela, que não conferiu o valor e apenas orientou Maria para que não transformasse aquilo em vício.

O plano de Maria parecia um desafio, ela buscava uma aventura, sem dúvida. Ao pensar em aventura, novamente lembrou-se da noite anterior, não conseguia chegar a uma conclusão se havia gostado ou não, talvez não tenha entendido o desfecho. Resolveu não mais pensar nisso.

O estrangeiro que não era estrangeiro estava em outra cidade, talvez ali pudesse encontrar um pouco de Maria, lembrava dela nua na cama, de bruços, contando sobre os prazeres que aquela cidade pode oferecer, um lugar preparado para os errantes, para aqueles que mergulham no desejo de se perder. Ele percorria as ruas com Maria em seus pensamentos, não compreendia o porquê de sua ações naquela despedida em que sentiu o beijo dela pela última vez. Gostaria de encontrar Maria nem que fosse em outra mulher. Estava atordoado.
Transou intensamente com três prostitutas naquele dia.

Não tão longe desse sofrido amante, Maria desembarcava com seus cabelos curtos e o convite colorido.
Foi a um hotel e dormiu.

(continua...)

19 dezembro 2008

Centavos

Zélia faz faxina.
Cássia guarda os centavos.
Roberta pede para Cássia pintar seus cabelos.
Nena não gosta de Roberta.

Zélia faz novamente a faxina.
Cássia conta seus centavos.
Roberta não gosta da tinta de seus cabelos.
Nena transa com o namorado de Roberta.

Zélia não faz a faxina, acabou a água sanitária.
Cássia acha 10 centavos na calçada.
Roberta chora.
Nena cuida de uma velha senhora

Zélia é casada com o irmão de Cássia, que é namorado de Roberta.

Nena pinta seus cabelos de loiro.

16 dezembro 2008

A Janela de Bogdanovich

Num desses fins de ano em que passei em São Paulo busquei aproveitar o tempo para conhecer um período do cinema americano um tanto obscuro pra mim: os anos 70. Conheço uma certa filmografia dessa época como os filmes de Scorsese, Kubrick, Woody Allen, Spielberg, Altman, entre outros, mas queria ir além e conhecer outros filmes e diretores. A motivação para esse estudo surgiu quando assisti aos extras de Touro Indomável, onde em um determinado momento se comenta que muito provavelmente alguns anos depois de sua realização (1980) nenhum estúdio toparia produzi-lo. Será que este filme, além de ser uma das obras mais expressivas de Martin Scorsese, também estaria marcando o fim de uma era dentro do cinema americano? Isso talvez possa ser melhor digerido ao ler o livro "Easy Riders, Raging Bulls" de Peter Biskind, no qual ele aborda esse período dos anos 70 do cinema americano que na verdade tem sua gênese já no final dos anos 60. Longe de fazer uma análise detalhada desse período ou tentar um denominador comum entre os filmes, buscarei aqui expor um pouco de minhas impressões através de um filme de Peter Bogdanovich chamado "A Última Sessão de Cinema" (1971).

Nova-iorquino, filho de imigrantes sérvios, Bogdanovich inicou sua carreira programando filmes no MOMA de Nova York e também como critico de cinema, inspirado, não por acaso, nos ventos que chegavam na América a partir da Nouvelle Vague francesa. Aos 32 anos dirigiu "A Últiima Sessão de Cinema", um filme que se passa numa pequena cidade dos EUA no início dos anos 50, e que traz em sua narrativa as experiências vividas por jovens principalmente nas suas descobertas sobre sexo e amor. A cidade, situada no Texas, está em pleno declínio, e o vazio e a melancolia tediosa se manifesta no único cinema que ali existe e que está às vésperas de seu fechamento, causado principalmente pelo advento da televisão. Toda essa atmosfera de abandono e decadência está expressa na fotografia em preto e branco do filme, mas também nas relações entre seus personagens. Os adolescentes são os protagonistas, que ao investirem em suas descobertas encontram castelos de areia, que se desmancham pela falta de consistência gerada principalmente pelos valores que aquela pequena comunidade impõe aos seus habitantes, baseados na hipocrisia e numa falsa moral. Os adultos, coadjuvantes na história, representam a decadência em si, todas as perspectivas de suas vidas não extrapolam os limites daquela cidade que definha lentamente e promove distâncias entre as pessoas.

É um corte na montagem do filme que me chamou a atenção pelo seu significado dentro de toda a narrativa. Jeff Bridges interpreta Duane, um jovem inconseqüente que flerta desde o início com Jacy, interpretada pela jovem Cybill Shepherd, e que faz parte da elite da cidade. Chega o aguardado momento em que irão para a cama pela primeira vez, fato que gerara em Duane uma forte expectativa por se tratar de uma conquista comparável à vitória de um campeonato, principalmente por causa de sua condição social, inferior à dela. Eles se encontram em um simples motel, as amigas de Jacy aguardam ansiosamente do lado de fora. Porém a medida que as coisas evoluem dentro do quarto, Duane percebe que Jacy não corresponde em nada ao que ele esperava daquele encontro, e ela ao perceber que ele se frustrara, revolta-se e surge uma discussão na qual Duane não encontra argumentos e deixa o quarto. Ao sair, ele passa pela amigas de Jacy com um semblante de satisfação, as moças então adentram no quarto e encontram Jacy descabelada, enrolada no lençol e simulando que fora algo maravilhoso. Logo em seguida vemos vários jovens da cidade num coral na escola cantando em tons firmes uma canção de exaltação ao estado do Texas. Essas duas cenas justapostas, a hipocrisia de uma jovem perante as amigas e o hino a uma honra perdida no tempo, conseguiu resumir toda uma afirmação de valores decadentes da sociedade americana, que no início dos anos 70 estavam sendo questionados com toda força pelos jovens cineastas que então surgiam e traziam para as telas personagens como Duane e Jacy, cidadãos americanos sem glamour, pessoas comuns de cidades comuns e que vivenciam seus dilemas imersos em um vazio propiciado pelas exigências da sociedade para que eles sejam quem ela deseja que eles sejam e não eles mesmos, com seus defeitos e angústias.

Bogdanovich faz parte de uma geração que nos trouxe excelentes diretores como Scorsese, Terrence Malick, John Schlesinger, Cassavetes, cujos filmes desse período buscavam uma reflexão mais profunda da América em sua volta, cada filme era questionador, o que enriquece a função do cinema como uma janela para que possamos nos lançar no autoconhecimento e assim pensar no que realmente é preciso para transformar não somente a sociedade, mas também nossas relações mais próximas com os que nos cercam.

A Última Sessão de Cinema (The Last Picture Show), EUA, 1971.

04 dezembro 2008

Cabelos castanhos com luzes

Fazia muito calor.
Maria estava completamente suada. Não havia dançado, encontrava-se ali apenas para encontrar uma amiga de sua confiança. O lugar era muito abafado.

Cerca de 30 minutos antes, Maria fechava uma porta atrás de si, um estrangeiro lhe devia dinheiro e disse que não lhe pagaria nenhum tostão, não havia gostado do seu serviço. Calma, Maria não é garota de programa, ela é uma fazedora de desenhos. O dinheiro, pelo menos aquele, era essencial para o plano de Maria.

Porão, música alta, suor e uma frustração misturada com revolta percorriam as veias de Maria. Ela decide conversar.

Expõe tudo sobre o estrangeiro a um outro estrangeiro que não era estrangeiro, este lhe ouvia, opinava discretamente e aproximava cada vez mais o seu rosto do dela. O suor descia pela nuca de Maria, sua cabeça girava, tudo estava realmente confuso naquele momento. Maria tinha um plano.

O estrangeiro que não era estrangeiro desapareceu daquele porão, Maria se afastara dele por um momento, um outro escutador estava presente e parecia mais atraente. Na verdade, esse outro escutador não precisava escutar nada, Maria nada queria lhe contar, apenas lhe beijar.

Maria, com o plano plenamente concebido em sua cabeça, decide ir embora, não é possível precisar se o outro escutador trocou beijos com ela ou não. Maria já estava no pé da escada.

Duas horas antes, a amiga de Maria, por telefone, lhe falou da festa no porão abafado, fazia um tempo que elas não se viam. No plano de Maria essa sua amiga era fundamental, pois é uma pessoa comunicativa e que sabe fazer amizades muito rapidamente.

No porão, já com a nuca e a testa suando, Maria encontrou sua amiga com um grupo de estrangeiros. No intervalo entre o primeiro e o segundo escutador as duas conversaram muito rapidamente sobre o plano. Somente três pessoas escutaram Maria naquela noite. Sua amiga gostou daquilo que chamou de um dos planos mais engenhosos para se conseguir algo tão exótico, Maria tinha imaginação, era o que lhe levava a crer ter acertado ao seguir a profissão de fazedora de desenhos, muito ao contrário do que pensava o estrangeiro caloteiro. A amiga lhe deu dois números de telefone e falou: "Amanhã às duas da tarde".

Trinta minutos depois, ali estava Maria no pé da escada e de repente o estrangeiro que não era estrangeiro surge e aproxima o seu rosto do modo que ele desejou a noite toda. Beijou Maria na boca. Maria correspondeu. Os dois estavam suados, ela um pouco mais que ele.

Um táxi, ruas desertas e dois amantes.

A madrugada avança, Maria e o estrangeiro que não era estrangeiro estão juntos num quarto, abraçados. Para ele foi um momento único, admirou a boca de Maria como nunca fizera antes com outra mulher e não cansava de sentir de perto aqueles olhos tão intensos.

Uma da tarde do dia seguinte.
Maria se veste, às duas terá que fazer as ligações.

Eles caminham pelas ruas, Maria conta aventuras de algumas viagens, ele a escuta e não pára de pensar nela.
A despedida é numa praça, seguem para lados opostos após um beijo, que jamais será esquecido por ele.

Apressadamente Maria dá prosseguimento ao seu plano.
No caminho até sua casa vem à sua mente um problema: o plano precisa de dinheiro, e ela contava com o valor do calote que levou.

(continua...)

[AGORA PENSE EM ALGO EXÓTICO E SUGIRA PARA O PLANO DE MARIA. ESCREVA NO COMENTÁRIO. Tyler Durden Fora do Caos TORCERÁ POR SUA IMAGINAÇÃO]