27 dezembro 2011

Há quase 11 anos

Pela quarta vez na vida deixei Pipa/RN. É sempre uma sensação de nostalgia que bate a medida que me afasto desse lugar, mas por outro lado considero um simples 'até breve'. Pipa é espiritualmente forte pra mim.

Saí da cidade com destino a João Pessoa/PB e a viagem começou numa van que me levou até a cidade de Goianinha, de onde eu pegaria um transporte para a capital paraibana.

Quando entrei na van eu era o único passageiro, porém alguns metros a frente entrou um casal de gringos, cujo idioma era indecifrável, mas com certeza era algo de origem germânica, nórdica ou escandinava. Eles estavam indo a Tibau do Sul para praticar kite surf.

Assim que eles entraram, o cobrador, num português escandinavamente incompreensível, explicou-lhes que eles subiram fora da parada permitida, o que poderia gerar multa. O atencioso cobrador até mostrou o fiscal parado na calçada. A mulher entendia português e falava 'um poquinho', como ela mesma me disse depois, mas não sei se compreendeu a lição do cobrador, porém mesmo assim explicou ao companheiro, em seu idioma nativo, e apontou com o dedo para uma placa de parada obrigatória.

Já na saída da cidade, o cobrador mostrou um campo de futebol aos gringos, falou algumas palavras, não sei em qual português, e no meio citou o nome Ronaldinho, o casal pensou que o craque havia jogado naquele campo, mas o cobrador disse que não, que o camisa 10 o Flamengo só pensa em dinheiro e jogava bem longe dali, no Rio de Janeiro. O gringos balançaram a cabeça.

A terceira intervenção veio para dizer aos gringos que eles poderiam usar a prancha do kite para surfar nas dunas. O casal não entendeu nada, tentei ajudar, mas demorei para compreender a palavra 'areia'. Após os gestos efusivos do cobrador, os gringos falaram: "sand board!, oh yes".

Depois que o casal desceu, subiu mais a frente um grupo de senhoras e duas delas se sentaram ao meu lado. Uma delas começou a reclamar do sobrinho que havia começado a tomar cerveja à 8h da manhã, e que desde a última sexta não parava de beber (estávamos numa terça).

Daí em diante, ela e a amiga começaram a criticar o consumo desenfreado de álcool. Criticaram também as pessoas que só gostam de farras, pois só se lembram de Deus quando estão enfermos numa cama e quando têm saúde não frequentam nenhuma missa.

Uma delas até comentou que gosta de uma caipirinha, mas em ocasiões especiais, enquanto que a outra informou sobre o seu próprio limite: "até dois copinhos de cerveja ainda vai..."

Por outro lado, a comilança está liberada. Ambas comentaram sobre a fartura de comida que consumiram nas festas de natal e o quanto são bons esses momentos para degustar tudo que é servido na mesa. Falaram de carnes, churrasco, leitão, etc, etc, etc

Desceram da van falando de comida.

A próxima passageira que sentou ao meu lado foi uma senhora acompanhada da neta adolescente. Elas estavam vindo da missa de quatro anos de falecimento de um amigo da avó.

O cobrador simpático e com olhos doces pra cima da jovem voltou a entrar em ação, perguntou à senhora se a garota era filha ou neta. A resposta foi bem poética: "ela é filha e neta". Curioso, o cobrador emendou outra pergunta para saber se a mãe ou o pai da garota era filho da senhora, esta respondeu: "o pai dela era meu filho".

O 'era' me chamou a atenção, olhei para a menina de corpo bem franzino e percebi seus olhos distantes, ela parecia alheia a toda aquela conversa. A avó elogiou a neta, que é bem calma, não gosta de sair e provavelmente vai puxar tanto o pai quanto à mãe, ambos eram caseiros e nunca estavam em farras.

Com uma voz triste, a senhora comentou que mesmo assim o filho foi embora cedo. O cobrador perguntou se foi acidente, a velha responde: "sim, acidente de trabalho, vai fazer 11 anos em fevereiro, essa menina tinha 4 anos na época". Nesse momento ela abaixa a cabeça e fica mexendo com os dedos na bolsinha de pano em sua mão.

Silêncio até Goianinha.

23 dezembro 2011

África logo ali


Meus olhos estavam semiabertos, minha mente relaxada e acordando. De repente ouvi algo como o choro de um cachorro, mas era tão baixinho que não sei se o meu estado 'saindo da sonolência' estava criando coisas na minha cabeça.

Resolvi levantar e na janela bem acima da cama eu enxerguei a cabeça de um cachorro que, com todo o esforço do mundo, estava tentando entrar na casa, ensaiei empurrá-lo pra fora, mas ele foi mais rápido e adentrou.

O cão, um vira-lata de pelos pretos arrepiados e com coleira, circulou pela casa um tanto perdido, depois parou e ficou me olhando. Tenho plena certeza que ambos estavámos confusos.

No relógio: 5:30 da manhã.

Já um pouco mais consciente da minha existência no mundo, abri a porta de frente da casa e o simpático cão despertador saiu correndo e tomou o rumo da praia. Em seguida fiquei congelado com o que vi.

Novamente falei pra mim mesmo que não havia nada de onírico naquilo tudo e que era a pura realidade diante dos meus olhos.

Presenciei, ou melhor, experimentei um nascer do sol inesquecível. Os raios solares estavam exatamente na linha do horizonte do mar e a forte luz amarela se impôs como um rei.

Foi assim que fui recebido na minha primeira manhã em Barra de Maxaranguape (RN).

***

No final da tarde caminhei pela praia até o Cabo de São Roque, conhecido como o ponto do continente americano mais próximo da África e da Europa. O local é cercado por uma bonita falésia e segui com passos lentos, parando para admirar a paisagem e molhando os pés no mar.

O lugar estava totalmente deserto.

Num determinado momento, eu avisto, um pouco mais ao longe, uma espécie de caixa boiando no mar junto à praia, pensei que pudesse ser uma caixa de isopor, mas logo percebi que não era. Parecia de metal e era na cor branca. Parei e fiquei observando.

Depois de um tempo, a misteriosa caixa encalhou na areia.

Daí em diante a imaginação percorreu diversos lugares, o mais mórbido talvez tenha sido pensar que era um pedaço da fuselagem do avião da Air France que caiu no Atlântico no ano passado; e o mais lunático foi desconfiar de ser algum tipo de lixo espacial.

Apesar do receio de encontrar algo como o Césio 136, resolvi me aproximar para ver o que era. Fui em passos lentos.

Alguns metros antes da caixa percebo um outro pedaço de metal branco estirado na areia. “Caraca, é a porta do avião”, pensei de forma besta. Besta porque logo vi que era a porta de uma geladeira. Sim, a caixa misteriosa não era nada além de uma geladeira.

Fiz o caminho de volta com outros parâmetros na imaginação: se a geladeira havia sido atirada do alto da falésia ou se aquele foi o destino desse pobre eletrodoméstico após meses em alto mar.

***


Não tenho foto nem vídeo do cachorro e da geladeira, mas compartilho com vocês o nascer do sol e o local onde me aproximei dos companheiros africanos.

Amanhecer:




Cabo de São Roque:

12 dezembro 2011

A dor dos meus calos

- Para onde você está indo? - Perguntou a mulher de unhas vermelhas ao padre numa pequena rua de asfalto gasto.
O religioso respondeu que estava a caminho do fim.

A mulher resolveu seguir o padre, que não se opôs, apenas acelerou os passos, talvez numa atitude de desafio.
A tarde findava e para as casas os trabalhadores retornavam, a rua com seu asfalto sofrível parecia se tornar cada vez mais áspera. As sombrancelhas mal feitas da mulher estavam úmidas de suor e os seus olhos abaixo apenas acompanhavam a cadência do padre.

Com a noite tudo escureceu e a mulher perdeu o padre de vista.
Roendo as unhas, a mulher pensou em voltar, mas a curiosidade sobre o verdadeiro fim lhe consumiu a alma e ela também se perdeu na escuridão.

Quando os calos de seus pés começaram a descascar a pele e redondas feridas lhe apareciam, a mulher encontrou uma família velando um corpo na porta de casa. Quis se aproximar mas ficou com medo de encontrar o padre já defunto. 

Descobriu que nesse momento sua fé já não existia mais. O choro das pessoas em torno do moribundo lhe angustiava, queria liberdade. Era o desespero de sua consciência. Ela saiu ao encontro do fim e o fim lhe apareceu antes do esperado.

Como acreditar nos nossos medos? Foi a última pergunta que ela mesmo se fez.

02 dezembro 2011

Cidadania - um amadurecimento necessário


Outro dia entrei no ônibus e à minha frente estava um rapaz que aparentava entre 16 e 18 anos de idade. Quando ele chegou na catraca, perguntou ao cobrador se o coletivo passaria no estádio, e com a resposta afirmativa o tal rapaz encostou no leitor do bilhete único uma pequena bolsinha de pano e zíper, em seguida pediu ao cobrador que liberasse a catraca.

Para quem não conhece o sistema de bilhete único em São Paulo, quando é um bilhete normal basta encostá-lo no leitor que a catraca libera automaticamente, desde que o bilhete possua créditos, obviamente; quando o bilhete é especial, geralmente como benefício para idosos ou pessoas com necessidades especiais, o beneficiário do bilhete precisa encostá-lo no leitor e esperar que o cobrador libere a catraca.

Pois bem, o cobrador solicitou ao menino que mostrasse o bilhete que estava dentro da bolsinha, e lá estava a foto de uma senhora no cartão. O cobrador perguntou quem era a mulher dona do bilhete, o rapaz respondeu que era sua tia. Prontamente o cobrador disse que não ia liberar e alertou de que se fosse outro funcionário teria confiscado o bilhete e a tia dele perderia o benefício.

O rapaz infrator continuou parado na catraca dizendo que estava indo encontrar a sua tia para entregar o bilhete. O cobrador perguntou se o rapaz não possuía dinheiro para pagar a passagem e, como era de se esperar, teve um não como resposta.

Eu já estava enfurecido e torcendo para que o cobrador mantivesse a rigidez, mas que nada, foi conivente e liberou a catraca para o rapaz apenas alertando para ele não fazer mais isso.

É justamente essa conivência que me deixa triste pois reflete nossa fraca cidadania. Comentei com o cobrador que aquilo era um ato de corrupção e que é muito fácil apenas jogar a culpa pra cima dos políticos. Confesso minha covardia em não ter reclamado e buscado evitar que o rapaz passasse pela catraca, porém nunca sabemos com quem estamos lidando e a violência é tão presente quanto pequenos gestos de corrupção.

Precisamos cada vez mais de uma ampla conscientização sobre o valor de um bem público. Quem pagou aquela passagem para ele ir ao estádio, muito provavelmente para comprar o ingresso de um jogo de futebol, foram os cofres públicos, e isso não pode ser admitido, e principalmente por quem deveria zelar por eles, como é o caso do cobrador de ônibus.

Mas enfim, é lamentável que cada um queira apenas saber do seu quadrado e da sua vantagem pessoal. Espero que com o tempo possamos compreender melhor o que significa corrupção e como ela tem sido o câncer mais nefasto que atinge nosso país.

01 dezembro 2011

Aliança


As suas mãos entram na terra escura como um carinho afável, mas também com a vontade típica de ardentes amantes que se tocam. É preciso recuperar aquela parte do jardim, o jardim que é somente seu e cuja beleza relaxa os olhos como um sonho.

Ela não consegue encontrar na memória o momento exato em que se apaixonou por aquele jardim, ele é uma extensão de sua existência. A manutenção do jardim lhe traz uma harmonia consigo mesma.

25 anos de idade ela possui com muitos desejos e expectativas na vida. A fúria de um conjunto de dúvidas lhe estremece o discernimento, e longe do jardim ela sente a loucura chegando aos poucos. Mas a terra do jardim está ali, e tocá-la ou fazer nela florescer mais um ramo, lhe devolve a razão, uma razão tranquila.

Os tormentos de sua mente se configuram por conta de fantasmas que plantam sementes de angústia e incertezas. Ela tem certeza de que provém de fantasmas, pois somente esses seres são capazes de nos assustar.

E o seu maior susto foi quando sentiu que o futuro parecia ruir bem na frente dos seus olhos.

A partir daí a força do jardim lhe deu forças. Numa manhã de muito calor ela deitou no meio do seu próprio jardim e descobriu que assim os fantasmas não se aproximariam.

Hoje o jardim parece cansado.

Ela consegue recuperar a parte danificada, porém do outro lado algumas flores não desabrocharam. Ela sente uma tristeza.

O suor do seu corpo não irá secar tão cedo.

17 novembro 2011

Novembros PJ

Rodrigo Araújo me abordou no final do show do Radiohead em 2008 e perguntou se eu achava que havia faltado alguma música no setlist da banda inglesa, de cara citei duas canções de minha preferência. Rodrigo balançou a cabeça e me disse algo assim: "Não faltou nada, o show foi perfeito!".

Claro que eu concordei com ele, o show havia sido espetacular e exigir mais seria um preciosismo sem tamanho.

É sempre muito louco e nonsense esperar que uma banda toque o setlist mais perfeito conforme a preferência de cada fã. Mas enfim, o Pearl Jam possui duas músicas que estimo em demasia, "Dissident" e "Leash", não por acaso pertencem ao meu álbum preferido "Vs".

Quando eles estiveram no Brasil em novembro de 2005, "Dissident" foi tocada em Curitiba e no Rio. Entre as duas cidades aconteceram os dois shows aos quais eu fui em São Paulo e onde eles não executaram essa música. Uma pena, mas nada a reclamar, foram shows inesquecíveis.

Para quem não sabe, o Pearl Jam nunca repete seus setlists, eles decidem o que vão tocar no mesmo dia da apresentação.

Eles voltaram ao Brasil em uma nova turnê em novembro de 2011 e lá fui novamente assistir a mais dois concertos da banda e obviamente esperei "Dissident". Não tocaram.

Cinco dias depois, no show que eles fizeram em Curitiba, essa música entrou no setlist. O mais curioso é que foi no dia do meu aniversário. Pois é, eles entregaram o presente no lugar errado...

Mas é isso aí, até agora estive em quatro shows dessa banda e contei essa história de "Dissident" apenas como um pequeno desabafo, pois os caras ao vivo são muito bons, não importa o setlist.


Para conhecer Dissident e ao vivo: clique aqui.

Para conhecer mais sobre o Pearl Jam clique aqui no site dos caras

Para conhecer todas as setlists do Pearl Jam: também no site dos caras.

Um grito que vem do rio

A releitura é uma interessante ferramenta para novas descobertas. De todo modo, também há o fator de amadurecimento pessoal, um dia nunca é igual ao dia anterior, mudamos constantemente. Foi refletindo o quanto eu havia mudado ou não, que cheguei ao final da releitura de "A Queda", de Albert Camus.

Uma das questões que me tocou foi o aspecto de julgamento, como a relação entre as pessoas pode agir como um tribunal do júri. A necessidade de superioridade em relação ao outro é algo que se estabelece quase como um poço de crocodilos.

Mas há uma fuga perante a crueldade da natureza humana? Quais mecanismos o homem encontra para se estabelecer nesse amálgama de sujeira e podridão? As vias são sinuosas e cada curva espera unicamente a miséria de cada um, não há morte, há humilhação.

Outro pensamento após essa releitura foi perceber que às vezes sinto uma atmosfera que exige nossas permanências, como se precisássemos encontrar sempre uma individualidade única e imutável. Somos compostos por nuances que em geral são conflitantes entre si e precisamos conhecer de perto esses conflitos, o autoconhecimento é gradual e as expectativas são cruéis.

Como medir a nossa própria percepção das coisas?

06 outubro 2011

Os Brincos Que Não Apertam

Os brincos não brilhavam, ela os tirou cuidadosamente de suas orelhas e os entregou a ele.

Ela se virou e caminhou até a porta, parou e tudo que ele esperou foi o retorno dela.

Ela e ele costumavam caminhar por horas entre as árvores de um pequeno parque próximo à casa em que moravam.

Foi ali que ele tocou o rosto dela pela última vez, sem dizer uma só palavra.

Os brincos ficaram guardados por um bom tempo.

20 setembro 2011

Uma manhã antes do clássico

Era uma quarta-feira de setembro e no domingo ia ter clássico. Flamengo x Botafogo. Logo me deu aquela vontade impulsiva de ver de perto o jogo. Seria minha primeira vez no Engenhão e a possibilidade de curtir um domingo no Rio.

Primeiro problema: ingresso. Como comprar uma entrada para o jogo a partir de São Paulo? Entrei no site oficial de vendas, mas só é aceito cartão de crédito com a bandeira VISA, eu tenho Mastercard. Eu estava realmente frustrado até que minha companheira de trabalho Cris disse que talvez uma amiga carioca poderia comprar. Acertamos tudo por fone e facebook e o primeiro obstáculo estava vencido.

Segunda questão: como chegar ao Engenhão? Eu sabia que devia ir de trem, mas desejava mais detalhes, condições, etc. Liguei para minha mãe em Manaus, que já havia ido duas vezes ao Engenhão, tudo que ela me falou foi pra não me preocupar, era só seguir o fluxo de torcedores com as camisas do Flamengo e do Botafogo. Bem, seguindo conselho da mãe, não me preocupei mais.


Comprei as passagens de ônibus, saí de São Paulo no sábado à noite, amanheci no Rio, fui caminhar em Ipanema e parei num quiosque no Leblon para tomar água de coco e descansar a mente. No final da manhã fui até a Tijuca pegar meu ingresso e depois voltei para o Largo do Machado onde desejava tomar uma cerveja num botequim antes de ir ao jogo.


Lembrei que eu havia visto esse botequim em uma das viagens ao Rio e ele me chamou a atenção por sua autenticidade, prédio antigo, numa rua sem badalação e um balcão já em idade avançada. O local fica na rua Gago Coutinho 51, não sei o nome, no toldo da fachada está escrito apenas 'restaurante', talvez porque nos fundos do bar funciona um charmoso restaurante.


Lá chegando, no bar havia dois vascaínos, um flamenguista e outros, a TV  estava ligada no canal SportTV e parei no balcão, pedi uma cerveja e um bolinho de bacalhau.


Recomendadíssimo o bolinho de bacalhau desse lugar.


Depois chegou mais um flamenguista e o vascaíno que estava ao meu lado no balcão foi embora, quando a esposa passou de carro para pegá-lo. No bar os assuntos eram diversos como as farras do Adriano e do Romário, fiquei apenas escutando, concordando e curtindo a descontração do lugar.


Tomei outra cerveja e comi mais um bolinho de bacalhau.

Às 13h paguei a conta e rumei ao Engenhão. Desci do metrô, entrei na estação Central do Brasil, segui o fluxo conforme minha genitora havia informado, sentei no vagão e logo em seguida comprei de um ambulante um latão de cerveja para degustar durante a viagem.


Foi um domingo bem agradável.

11 setembro 2011

Um homem de muletas e a pastelaria

Quando cheguei em Curitiba para acompanhar a itinerância do Festival de Curtas para o qual trabalho, peguei um ônibus no aeroporto e desci em frente à Biblioteca Municipal, onde iria esperar pela Denize, que produziu e coordenou essa itinerância. Quando lá desembarquei do coletivo, ela não havia ainda chegado, andei uns poucos metros e dei de cara com uma pastelaria, entrei e pedi um pastel de queijo. O estabelecimento estava lotado, eram por volta das 13h e não havia lugar para sentar. Peguei meu pastel e fui degustá-lo na calçada, o que me facilitaria também esperar pela Denize.

Após umas duas mordidas, um homem de meia idade e de muletas se aproximou de mim, apesar de estar mal vestido logo percebi que não se tratava de um mendigo. Logo ele puxou conversa comentando como estava lotada a pastelaria, respondi alguma coisa e ele começou a falar da bondade e generosidade do dono, o que era uma das chaves de seu sucesso.

A história do homem de muletas era um pouco confusa, mas pelo que pude apreender, um dia ele teve um bom emprego, gozava de uma boa situação financeira e era cliente assíduo da pastelaria. Mas a sua vida sofreu uma reviravolta, ele perdeu tudo que tinha e chegou a morar na rua, e numa dessas situações precárias o dono da pastelaria lhe encontrou e disse que ele poderia ir até o seu estabelecimento que o tratamento seria igual, pois ele considerava que pelo fato dele ter sido um bom cliente, isso o ajudou a crescer e que nada mais justo que retribuir principalmente naquela situação em que o homem de muletas se encontrava.

Considerei muito humano aquele homem compartilhar comigo essa história, e esse exemplo de generosidade me chamou bastante a atenção. Gosto de Curitiba, é uma cidade bem agradável, tenho bons amigos curitibanos e inclusive já namorei uma curitibana, porém nas três vezes anteriores que visitei a cidade, eu senti uma hostilidade peculiar, como se qualquer aproximação fosse impossível. Dessa vez, essa abordagem inesperada logo na minha chegada e falando de ações generosas me tocou, e nos dois dias que passei na cidade, senti tudo mais aberto e uma receptividade que não havia ainda experimentado em Curitiba.

Costumo dizer que as coisas se facilitam quando se entra de coração aberto, e talvez esses quase 8 anos sem ir à Curitiba me amadureceram mais do que as transformações que a cidade possa ter sofrido. Sei lá, poder ser uma viagem da minha parte, mas quis compartilhar esse sentimento.

09 setembro 2011

Nossos últimos dias

Ela estava em frente ao portão de madeira, havia tocado a campainha por três vezes e nenhuma resposta. Apenas o forte latido de um cão do outro lado do portão.

Ela lembrou que não tem medo de cachorro, mas aquele latido parecia tormentar muito a sua cabeça. Era uma nítida comprovação de sua ansiedade.

Pela quarta vez ela tocou a campainha, e após um tempo ela escutou passos vindo em direção ao portão. O cachorro não parava de latir.

Antes da chave abrir o portão, ela lembrou dos nossos últimos dias.

A lembrança carrega intensidade, algo mais pulsante que a mera sensação de um momento. Mas será que ela existe para ativar o que se define como saudade? Ela rememorou tudo e quis sorrir, procurou fugir de qualquer metafísica que poderia tirar a boa simplicidade daqueles dias, desejou apenas lembrar para não esquecer.

O portão abriu e o cachorro parou de latir.

07 setembro 2011

Jardim

Renata casou com Fernando e agora esperava por seu primeiro filho, se nada de inesperado acontecesse, daqui a 3 meses ela o teria em seus braços. Mas sempre tem uma amiga que lança alguma coisa nos pensamentos e daí em diante coisas irreais podem parecer muito reais.

Joana estava com quase 40 anos e três filhos em um único casamento, se considerava apaixonada pelo seu marido, mas disse a Fernanda que estava desconfiada de alguma coisa pois encontrou pequenas manchas de sangue em suas camisas. Ao perguntar para o esposo o que aquilo significava ele disse que havia se cortado com papel, afinal ele é dono de uma gráfica. Joana não iria sossegar até descobrir a verdade.

Dias se passaram até que Fernando, marido de Renata, começou a ter fortes ataques de tosse. Quando começava ele sempre corria para o banheiro. Num desses ataques, Renata entrou no banheiro logo depois que ele saiu e encontrou gotas de sangue na pia. Assustada, ela correu até o marido e perguntou sobre o que acabara de ver, ele disse que não estava expelindo sangue nenhum, ela o levou até a pia e mostrou a ele. Fernando a segurou pelos braços, deu-lhe um beijo na boca e disse: "Você precisa descansar!". Não havia sangue.

A tosse de Fernando foi piorando, o diagnóstico do médico apontou uma virose e que logo ia sarar. Renata ficou temerosa de que algo pior estivesse acontecendo com o seu marido, longas discussões aconteciam e mais gotas de sangue ela via não somente na pia, mas também nas roupas dele. Renata estava entrando em parafuso.

Num domingo de sol, Renata se levantou da cama e encontrou o marido preparando a mesa do café. Ele disse a ela: "A tosse passou." Ela sorriu e eles se beijaram.

Durante o café Fernando limpou sua boca com um guardanapo de papel. Os olhos de Renata se arregalaram. Havia manchas de sangue no guardanapo. Renata desmaiou.

Tudo seguiu em frente, veio o bebê, tiveram mais filhos e nunca mais conversaram sobre a tosse de Fernando, que antes dos 50 sofreria com duas pneumonias em tempos de inverno.

21 agosto 2011

Carregar

O telefone tocou.
Com os pés descalços ela corre pelo apartamento e atende. Era a confirmação de um encontro com velhos amigos e amigas.

Ela desce e vai até a esquina, onde seu namorado lhe pegaria com a moto dele.

A espera começa a ficar longa. Seu celular está descarregado.

Um índio se aproxima. Ele está com a cara pintada e se dirige a ela numa língua que ela não compreende. Sem saber muito o que fazer, ela aponta para uma padaria do outro lado da rua. O índio fica imóvel.

Muito assustada, ela corre em direção à padaria, entra no estabelecimento e pede uma coca-cola. De repente ela tem um ataque de riso e vai embora, passa pelo índio e volta pra casa.

Com o celular carregando, ela dá uma bronca em seu namorado. Ele está preso numa manifestação contra a construção de uma hidroelétrica próxima de uma área indígena.

Alucinação, foi a palavra que ela escreveu no bloco de notas na porta da geladeira, e depois correu pelas ruas de sua cidade com um cocar na cabeça.

13 agosto 2011

Silêncio e memória

Ele era um homem muito vaidoso e aquela viagem poderia lhe impor certas coisas para as quais ele não estava preparado. O ônibus seguia em frente na estrada, não havia como voltar.

Pelas calçadas da pequena cidade, o homem buscava em sua lembrança momentos que ali viveu e que lhe trouxessem alguma felicidade. Não havia nada.

A casa de sua irmã era modesta, foi alojado no quarto dos seus sobrinhos que por sua vez foram transferidos para a sala. Naquela primeira noite ele dormiu muito bem.

Uma velha senhora chamada Sonia desejava ver aquele homem, que por muito tempo viveu naquela cidade e hoje estava ali como um estrangeiro. Sonia vivia uma decadência particular, ela não possuía mais poder, seu marido estava morto junto com todo o respeito que os moradores daquele lugar poderiam lhe dar. O homem foi visitá-la.

Na cozinha, enquanto eles degustavam um pão de milho com café, o silêncio era o verdadeiro companheiro daquele encontro, não trocaram nenhuma palavra. Sonia parecia necessitar apenas da companhia daquele homem, que de algum modo compreendia aquela situação.

Ao longo dos cinco dias que ali passou, o homem percebeu que as suas memórias da cidade, vazias e sem felicidades, eram o reflexo da opressão do silêncio de seus habitantes. Decidiu que na sua última noite encontraria um sentido para o regisro de uma lembrança feliz.

Ele foi a uma festa, conheceu uma mulher, se beijaram e caminharam pelos arredores da cidade até amanhecer.

Anos depois, essa mulher se casou e havia esquecido daquela noite. Até que um dia seu marido chegou com o nariz sangrando e não quis lhe contar o motivo, ela sentia que ele nutria um sentimento de vergonha. Foi então que ela sentiu uma felicidade por dentro ao perceber que seus pensamentos haviam resgatado a noite da festa, quando ela havia exposto todos os seus segredos e vontades, que apesar de ter sido a um estranho, foi um dos momentos mais libertadores de sua vida e que a sua memória esfumaçou sob a névoa de silêncio da sua cidade.

26 junho 2011

Uma garota que gosta de Blur

Estação ferroviária Júlio Prestes, São Paulo, Brasil.

São 11 horas de um sábado, o movimento de usuários do trem urbano não é tão grande.

Marcelo, 33 anos, entra no saguão da estação com uma pequena bolsa a tiracolo. Ele se aproxima da catraca. Um trem chega. Ele observa atentamente os passageiros que desembarcam. O trem parte e ele volta para a entrada da estação.

Ali encontra uma amiga de nome Joana, um pouco mais velha que ele. Marcelo pergunta se ela trouxe o celular dele, Joana entrega o aparelho para Marcelo que o liga em seguida. Joana pergunta que horas ele marcou com a garota, Marcelo responde que às 11.

Joana pergunta a idade dela, e o amigo diz 22. Marcelo se despede da amiga e se aproxima da catraca novamente.

Joana fica um tempo parada na entrada da estação, depois volta até o amigo e pergunta se ele trouxe a câmera digital.

Joana tira várias fotos da fachada da estação. Após um tempo Marcelo se aproxima e diz que está preocupado, a garota demora demais. Ele tenta ligar pra ela, mas não consegue resposta, dá na caixa postal. Joana diz que não entende o que Marcelo viu nessa menina, que pra completar mora muito longe.

Marcelo apenas fala: - Ela gosta de Blur.

Marcelo volta para junto da catraca. Vários trens chegam e nada da garota. Joana se aproxima e lhe entrega a câmera, quando ela vai se despedir, Marcelo pergunta se ela poderia ficar um tempo ali com ele. A princípio Joana não aceita, mas depois cede.

Já é meio-dia. Joana bebe água na boca de uma garrafa de plástico, e enxugando os lábios com a mão, ela diz para Marcelo desistir. Marcelo bebe um pouco da água e resolve ir embora. Na entrada da estação Marcelo pede a câmera de volta para Joana. Ela diz que devolveu faz tempo. Marcelo diz que impossível, não está com ele. Eles voltam para junto da catraca, procuram nas proximidades e não encontram nada.

Marcelo e Joana brigam, trocam desaforos e um joga na cara do outro certas intimidades infames.

Joana pede o celular de Marcelo emprestado para tirar novamente as fotos. Os olhos dele se arregalam como se não acreditasse no que ouviu, mas ele entrega o celular, talvez pra evitar mais discussões.

Marcelo volta para junto da catraca e observa os trens que chegam.

Entre a quarta e a quinta foto, o celular de Marcelo toca. Joana observa o amigo de longe enquanto escuta "to the end" como toque musical do aparelho.

08 junho 2011

Filme gay é censurado no Acre

Caros, abaixo uma carta aberta da produtora e do diretor do curta "Eu Não Quero Voltar Sozinho". O filme foi censurado por conta de sua exibição em sala de aula num projeto pedagógico no Acre.
Solicito a todos que divulguem e lancem debates sobre esse grave ataque ao curta-metragem brasileiro, à cultura e à possibilidade de avançarmos na construção de uma sociedade com mais compreensão de nossas diferenças.

"Queridos amigos e colegas,

No início da semana recebemos a notícia de que a exibição do curta Eu Não Quero Voltar Sozinho, como parte do programa Cine Educação, havia sido censurada no Acre.

O programa Cine Educação, uma parceria com a Mostra Latino-Americana de Cinema e Direitos Humanos, tem como objetivo "a formação do cidadão a partir da utilização do cinema no processo pedagógico interdisciplinar" e disponibiliza diversos filmes cujos temas englobem os direitos humanos, de modo que professores escolham quais são mais adequados para serem trabalhados em aula.

Na semana passada, no estado do Acre, uma professora escolheu o curta Eu Não Quero Voltar Sozinho e exibiu-o para seus alunos. Para aqueles que não conhecem, a trama narra a história de Leonardo, um adolescente cego que, ao logo do filme, vai se descobrindo apaixonado por um novo colega de sala.


Alunos presentes na exibição confundiram o curta metragem com o "kit anti-homofobia" e levaram a questão aos líderes religiosos, que mobilizaram políticos da região com o intuíto de proibir o projeto Cine Educação como um todo. Nenhum desses representantes públicos deu-se ao trabalho de ir atrás da verdade e descobrir que se tratava de um programa pedagógico com o intuito de levar o debate sobre direitos humanos para a sala de aula. Mais uma vez no Brasil, a educação perde a batalha contra o poder assustador das bancadas religiosas e conservadoras.

Neste momento, o programa Cine Educação está paralisado. Enquanto isso, os secretários de Educação e de Direitos Humanos do Acre estão articulando com o governador a possibilidade de garantir sua continuidade, enquanto os líderes evangélicos forçam o cancelamento definitivo do programa. Pelo que sabemos, mesmo que o programa seja reativado, o curta Eu Não Quero Voltar Sozinho será excluído do catálogo e não mais ficará disponível para que professores o utilizem no debate de questões que envolvem algo tão elementar quanto a sexualidade humana e tão importante quanto a deficiência visual.

De forma arbitrária, em uma república federativa cuja Constituição atesta um Estado laico, a sociedade está sendo privada de promover debates. Como pretendemos que adolescentes consigam respeitar a diversidade e formem-se cidadãos lúcidos, pensantes e ativos se informação, arte e cultura (sem qualquer caráter doutrinário) lhes são negadas?

Eu Não Quero Voltar Sozinho não é um filme proselitista, tampouco ergue bandeiras de nenhuma natureza. É apenas uma obra de ficção amplamente premiada em festivais de cinema no Brasil e no exterior, cujos predicados artísticos e humanos transcendem qualquer crença. Ademais, se assuntos referentes à orientação sexual dos indivíduos e seus respectivos direitos civis está na pauta do Supremo Tribunal de Justiça e do Congresso Nacional, por que não debatê-los em sala de aula? Que combate sombrio é esse, que reacende a memória de um obscurantismo Inquisidor?

Produtores do Eu Não Quero Voltar Sozinho

Daniel Ribeiro e Diana Almeida"

http://www.lacunafilmes.com.br/sozinho/


P.S.: Segue o link para o curta, que está disponível no YouTube: http://www.youtube.com/watch?v=1Wav5KjBHbI

Site do Cine Educação: http://www.cinemateca.gov.br/page.php?id=91

14 maio 2011

Semelhança

A compreensão de um gesto. Há um passado.

Semelhança.

Não há necessidade de compreendermos um significado singular acerca de nós mesmos. É necessário permitirmos sempre a nossa amplitude.

Encontro.

Notei o quanto a distância se firmou pela consciência. Havia sonâmbulos por todos os lados, o sono tranquilo se tornava uma dádiva. O afastamento se tornou irremediável.

24 abril 2011

Continuar viva

Era o seu filho que estava caído embaixo de uma bicicleta do outro lado da rua. Ela correu e chegou até ele. O joelho do menino estava bastante machucado e o sangue escorria pelas finas pernas. Foi um susto e o menino sobreviveu.

Dois dias depois um amigo de seu filho lhe procurou, disse a ela que na queda da bicicleta o menino havia perdido uma sacola que alguém levou embora se aproveitando da situação. A mãe ficou confusa e queria saber que sacola era essa e o que havia dentro. O amigo de seu filho apenas falou: - Tudo que a senhora precisa para continuar viva.

A mãe não levou a sério, acreditou que era uma brincadeira.

Uma semana depois do incidente com a bicicleta, o filho cai de cama e uma forte pneumonia obrigou a internação em um hospital da cidade. Ele piorou muito rápido e após três dias de internação os médicos não tinham mais esperanças, apenas aguardavam pelo pior. A mãe chorava, os exames indicavam uma bactéria fatal.

A bicicleta foi destruída e queimada num terreno perto do prédio onde moravam, exatamente vinte dias depois da queda que ralou o joelho do garoto, que agora estava morto e enterrado. A mãe enlouqueceu e precisou de auxílio psiquiátrico.

Um dia ela foi uma mãe, hoje ela apenas costura sacolas imaginárias.

21 abril 2011

A estrada da felicidade

Germana dirigia seu carro numa estrada de terra. O sol brilhava forte e tudo era muito quente.

Se existisse um conceito de felicidade, ele estaria presente no coração de Germana, pois seus 25 anos não eram decepcionantes, não conquistou tudo que queria, mas tinha a certeza de que seu automóvel chegaria ao destino mais certo de sua vida.

Um homem muito velho estava parado na estrada. O carro de Germana passou por ele e logo depois freou. Ela virou o pescoço e ficou olhando para aquele homem, imóvel debaixo de seu boné surrado. Com muita calma, Germana encontrou sua máquina fotográfica na confusão de coisas que era a sua mochila.

Germana desceu do carro e caminhou até o velho.

Os olhos do homem se viraram para ela e com uma voz cansada ele disse "bom dia".

A moça respondeu com um sorriso e os olhos daquele solitário idoso se voltaram para a terra seca da estrada. Germana ensaiou preparar a câmera e antes do visor chegar em seus olhos, ela desistiu. Sentiu, por alguma inexplicável sensação, que aquilo deveria pertencer somente à sua memória.

O suor escorria pela testa de Germana.

O velho homem ajustou o boné na cabeça e em seguida cutucou uma das unhas de sua mão. Germana estava a menos de um metro deste homem e sentiu que na verdade havia uma distância muito maior. Tentou medi-la com a felicidade de seu coração e sentiu o pior sentimento de egoísmo e arrogância, por que ela deveria se julgar muito mais feliz que aquele homem? Percebeu que a foto que ela não tirou buscaria demonstrar isso, uma falácia sem tamanho. Lembrou do filme macedônio "Antes da Chuva".

Germana disse "foi um prazer conhecê-lo", o velho levantou o rosto e retribui com um sorriso aconchegante de poucos dentes.

Um blues em alto volume explodia no interior do carro de Germana enquanto ela dirigia para o seu verdadeiro destino, pelo menos até aquele momento ele era realmente verdadeiro.

12 março 2011

A conversa do xará

Na piscina, durante as três aulas semanais de natação, procuro sempre manter a respiração adequadamente. É importante para que o nado tenha uma boa eficiência e também evita um maior esforço e cansaço. Mas independentemente do esporte, é bom sabermos respirar, isso muitas vezes influencia inclusive a nossa postura. É uma pena que se ensine muito pouco às crianças sobre o valor da respiração.

Respirar também pode siginificar sentimento, algo interno que molda nossas aspirações, ansiedades e estado de espírito. Minha respiração em jogos do Mengão é uma verdadeira montanha russa de emoções. E quem nunca ficou apaixonado e sentiu a respiração mudar?

Era um dia normal de uma semana de trabalho e eu voltava para casa de ônibus. Atrás de mim estavam sentados um rapaz e uma moça, que pela conversa de ambos pude perceber que eram colegas de trabalho. O papo era de trabalho e eles estavam crucificando um terceiro colega que tinha a incomoda mania de se meter na vida alheia. Peguei minha Piauí e segui a viagem lendo.

Lá na frente, quase perto de casa, paro a leitura e volto a escutar a conversa do casal atrás de mim. A moça dizia que havia ido ao médico, pois não se sentia bem, se sentia fraca e sem vontade de fazer as coisas. Lá chegando, o doutor lhe disse que ela não tinha nada, tudo era estresse e cansaço, ela precisava de férias e que se ela descansasse devidamente, até o namorado ia sentir a diferença. Percebi então que o xará, sim ele se chamava William, alterou a respiração e perguntou em voz mansa: "e aí, ele sentiu?"

A moça riu discretamente e disse que isso era brincadeira do médico, pois ela não tem namorado, saiu de um relacionamento há pouco tempo e não quer se envolver com ninguém, pois tem medo de sofrer novamente. Nova manifestação na respiração do xará, ele comenta em voz doce: "mas você está ótima, é uma pessoa bonita". Ela ri e agradece. O xará emenda, com uma respiração mais relaxada: "você é uma pessoa legal, atenciosa, divertida". A moça segura a respiração por um breve tempo e depois diz "obrigada".

Chegou a minha parada. Levantei e ao passar pelos dois a vi encolhida de cabeça baixa, rindo e com as mãos entre as coxas. O xará estava com o corpo virado pra ela contando algo que devia ser engraçado.

Desci do ônibus e voltei pra casa, na manhã seguinte eu tinha piscina marcada para exercitar a minha respiração.

20 fevereiro 2011

Perseguição

A calçada estava molhada, à sua frente um idoso em passos lentos com a coluna devidamente ereta e firme. Aquele homem possuía uma elegância.

Talvez sendo uns 50 anos mais nova que esse homem, ela resolveu segui-lo, pelo menos até o final da rua. Gostou da idéia de poder observar cada movimento do corpo do ancião.

Os dedos dele faziam leves gestos no ar, como se tocassem em algo muito macio. A jovem seguidora de velhinhos tentou imaginar quantas peles não haviam sido tocadas por ele. Mas ao mesmo tempo pensou por que sempre imaginamos que todos os anciãos possuem uma experiência muito maior que a nossa. Os anos de vida são a baliza?

Agora fixou seus olhos nos ombros, que estavam alinhados. Uma postura invejável. Veio à mente dela pesos, aqueles usados em balanças de antigamente. Mas nem sempre os pesos estão somente sobre os ombros. Uma vida custa outras sensações, sem dúvida.

O homem parou.

Ela sentiu um frio dentro de si. O que fazer? Ela precisava decidir rápido. Por algum motivo ela não compreendia como aquilo não fazia parte do seu plano. Mas que plano? A sua mente parecia ferver.

Resolveu ultrapassar o velho homem e foi embora sem olhar para trás.

Talvez um rosto jamais desse conta de explicar toda aquela confusão de pensamentos.

16 fevereiro 2011

Energias

Sim, era uma lanterna que ela tinha em suas mãos. O escuro a absorvia por todos os lados. E tudo que lhe restava era a duração das pilhas daquela lanterna.

Sem parar um instante sequer, ela continuou caminhando pelos indecisos caminhos da escuridão. A todo momento se perguntava por que tanta desconfiança em si mesma. Não conseguia ter resposta nenhuma, no fundo ela não se conhecia. Uma vida inteira longe de sua própria alma.

Ela começou a cantarolar uma bonita música. Gostou de pensar na possibilidade de forçar uma beleza mínima naquele caos em que vivia.

As pilhas chegaram ao fim de suas vidas úteis.

Não havia mais nada para ver. A cegueira forçada lhe impedia de caminhar. Muitos sinos tocaram e ela retomou a canção. Sua voz exprimia tristeza.

Sim, somos tristes.

Ela cantarolava a canção com uma voz miúda. Deixou os braços abertos para sentir o vazio em sua volta. Ela desistiu.

A consciência de sua distância perante tudo e todos lhe apertou o peito.

Sim, te desejo perto de mim, não me deixe na escuridão. Minha alma se iluminará ao seu lado.

08 fevereiro 2011

Nas entranhas da mente no balé e na piscina

Não foi dessa vez que Natalie Portman me fez ir ao psicólogo.

Em duas ocasiões anteriores ("O Profissional" e "Star Wars"), essa israelense, nascida em Jerusalem e criada em New York, me deixou pensando em coisas além filme e que são capazes de levar muita gente a buscar ajuda psiquiátrica. Em "Cisne Negro" fiquei preocupado, um amigo gay assistiu ao filme e se apaixonou por Portman, logo imaginei que ela havia preparado também algo para mim. Mas nada aconteceu.

Reconheço que Portman está muito bem no filme, mas para não fazer meus holofotes caírem somente nela, gostaria de comentar acerca de um dos pilares fundamentais de "Cisne Negro": a perfeição. A força do filme está na concepção visual dos emblemáticos distúrbios manifestados na mente debilitada de uma bailarina que busca a perfeição plena.

Compartilhar a trajetória da personagem de Portman no filme é muitas vezes sufocante. Como já feito anteriormente em suas obras, o diretor Darren Aronofsky nos coloca num desgovernado carrinho de montanha russa. A impressão que dá é que no início do filme estamos à beira de um precipício e logo alguém nos empurra ladeira abaixo e o abismo parece sem fim.

Hoje vivemos num mundo inteiramente midiático. O que vale no entretenimento é o espetáculo, é a possibilidade visual de vivermos uma experiência intensa. Ser aplaudida de pé com todas os louvores possíveis é um reconhecimento que faz valer todo e qualquer, mas qualquer mesmo, esforço de uma bailarina que busca a excelência. Sinto que o filme explora uma reflexão mais profunda sobre esses valores atuais do preciosismo perfeito na arte, no entretenimento e por que não, no esporte.

Pequim, Olímpiadas de 2008. Michael Phelps já era a lenda viva no Cubo D'água e na História dos jogos olímpicos. O mundo inteiro assistia à sua perfeita performance na piscina com as melhores imagens geradas para uma competição de natação, um espetáculo, sem dúvida. Quando ele disputou os 200m nado borboleta, chegou em primeiro, ganhou sua terceira ou quarta medalha e bateu recorde. Porém, assim que encostou a mão na borda da piscina, ele tirou seus óculos com toda a força, os arremessou na água e a sua expressão era de revolta em alto grau. Havia entrado água em seus óculos.

Phelps terminou a prova com o tempo de 1min52seg03 (recorde mundial), mas se não fosse a falha em seus óculos, ele teria atingido o que buscava, que era a marca de 1min51seg. Não é difícil imaginar que nos últimos 50 metros de piscina sua mente deveria estar produzindo tantos distúrbios quanto aqueles em volta de Natalie Portman durante sua apresentação final. A perfeição estava em jogo.

A partir dessa característica de "Cisne Negro", acredito que a arte, assim como o esporte, esteja superando algumas barreiras delicadas. A exigência de superação parece desumanizar e destruir bases emocionais necessárias para uma existência pacífica de um ser humano consigo mesmo. Talvez esse seja o caminho natural e pouco se possa fazer para evitá-lo, mas atenção e cuidado nunca são demais.

05 fevereiro 2011

Os gritos de uma mulher

Kika está no interior de seu quarto, o único de uma casa em um bairro distante. É uma madrugada fria, e deitada com os olhos bem abertos ela escuta os gritos de uma mulher. Esses gritos às vezes se misturam com um choro desesperador.

Na impossibilidade de adormecer, Kika se levanta e caminha em círculos pelo seu quarto. As frieiras de seus pés coçam ardidamente e seus olhos parecem carregar pesos insuportáveis. Mas ela está decidida a andar até cansar.

Kika foi uma criança com alguns problemas estranhos para enfrentar. Seus pais costumavam rezar muito e logicamente a obrigavam fazer isso também. Em uma de suas orações desconcentradas, ela sentiu um sussurro em seu ouvido, não conseguia entender muita coisa, apenas que a palavra 'sangue' se repetia várias vezes. A partir desse dia, todos os dias ela via alguém ensanguentado, era comum na escola, na rua e na TV. Até que uma vez seu pai matou um homem dentro de casa. Foi a última pessoa ensanguentada que ela viu.

Nunca saberemos se ver sangue é ou não um trauma para Kika, que parou de rezar aos quinze anos de idade.

O dia amanhece. Kika está estirada em sua cama. Os gritos e choros continuam. Com os olhos fixos no teto, Kika sente o desespero em seu coração.

02 fevereiro 2011

Fui a Somewhere e curti

Não sou um profundo admirador do trabalho de Sofia Coppola, reconheço que ela tem talento, sabe fazer as coisas, mas seus três primeiros filmes pouco me acrescentaram alguma coisa. Fiz questão de assistir ao “Somewhere” (Um Lugar Qualquer), quarto longo da diretora, que estreou recentemente em São Paulo, e saí bem satisfeito com o que vi.

Sem ter lido uma letra sequer sobre o filme, os 15 minutos iniciais me conquistaram fortemente, informações esparsas, mas precisas, do personagem principal, construíram ebulições enigmáticas. Não busquei compreender nada, apenas experimentar. Quando o primeiro diálogo surge e descubro a profissão do personagem, as coisas parecem fazer sentido, mas ainda estão nebulosas. E talvez esse seja o real sentimento do personagem perante a sua própria realidade. Daí em diante Sofia Coppola me cativou de vez e mergulhei sem medo no filme.

Curti bastante a interpretação de Stephen Dorf, seguro nas sutilezas de um personagem complexo. Complexidade medida através da indiferença manifestada por ele com as coisas que acontecem a sua volta. Por outro lado, ele não é apenas um entediado, talvez ele simplesmente não compreenda como aquilo tudo pode ter algum sentido. Há uma forte pressão interior para que ele seja indiferente, mas nem ele consegue se autodefinir para agir dessa maneira. É um personagem com nuances bem desenvolvidas pelo roteiro e pelas imagens construídas do filme.

Acredito que a diretora conseguiu harmonizar uma narrativa existencialista sem vitimização ou heroificação do personagem, características que, particularmente, senti e me incomodaram nos seus filmes anteriores. Em “Somewhere” há um humanismo para pensarmos sobre nós mesmo, e isso é muito bom!

01 fevereiro 2011

Tiradentes - Dia 1 Parte Dois

Ainda no meu primeiro dia participando da 14ª Mostra de Cinema de Tiradentes, saí da primeira sessão de curtas, jantei comida mineira e em seguida fui à praça central da cidade para assistir à Série 1 da Mostra Curtas na Praça. A sessão foi boa, filmes leves, mas com uma boa dose de consistência em suas narrativas e num diálogo muito bom com o público, que se divertiu e reagiu em praticamente todos os curtas.

Costumo ficar na dúvida se curto ou não sessões ao ar livre, pois sou muito fã de sala fechada, escura, som vindo de todos os lados e aquela imersão completa no filme. Mas considero toda iniciativa de exibição de filmes sempre válida e essa sessão de Tiradentes foi bem interessante para observar a interação do público. As reações foram as mais diversas possíveis, mas uma me chamou a atenção.

Ao meu lado havia uma senhora que estava com dois netos, um menino e uma menina. O primeiro praticamente não viu nenhum filme, ficava correndo pra lá e pra cá, a menina ficou quietinha vendo atentamente todos os curtas. Durante o filme “Traz Outro Amigo Também”, sobre um detetive que vai descobrir o paradeiro de um amigo imaginário da infância de um velhinho, a senhora passou a projeção inteira tentando acertar qual seria a cena seguinte, o curioso é que em algumas ela acertou. Isso me incomodou de início, mas depois percebi o quanto aquele filme estava sendo um exercício de imaginação pra ela, assim como o detetive do filme, que precisou de muita imaginação pra resolver o seu caso. No final da sessão, enquanto rolavam os créditos do último filme, a senhora se levantou e puxou a neta, que resistiu um pouco, pois seus olhos ainda estavam colados na tela. Boquiaberta, a menina parecia não querer sair do universo daquela sessão.

De lá corri diretamente para o Cine Tenda para outra sessão de curtas, a Série 1 da Mostra Foco. E aqui retomo a questão sobre observar, principalmente em relação ao primeiro e ao último filme da série. A sessão começou com o documentário “Retrato de Suzana”, dirigido por Leonardo Amaral e Lygia Santos. É um curta que acompanha um dia de trabalho da cabeleireira Suzana, a câmera inicia na saída de sua casa para o salão de beleza e lá ficamos até o anoitecer quando Suzana e suas amigas têm aula de pintura. Durante todo o filme, a minha questão principal era buscar apreender se aquela proposta de observação dos diretores me transmitia algo ou não.

A câmera flerta com certo voyeurismo, mas acredito não ser essa a intenção, percebi mais um sentido em nos fazer absorver o ambiente de trabalho de uma pessoa comum e interagirmos com a simplicidade apresentada. Porém não consegui um envolvimento pleno, as imagens pareciam um registro pela registro, senti falta de uma melhor elaboração dos enquadramentos. Por outro lado reconheço que os diretores arriscaram positivamente, a edição flui bem e há um esforço significativo para nos inserir no salão de Suzana e compartilhar algo.

Quanto ao último curta da sessão, “O Sarcófago”, de Daniel Lisboa, a sensação foi inteiramente contrária. Já assisti a esse filme algumas vezes e fiz questão de revê-lo, pois sinto que a proposta do diretor em documentar o personagem Jayme Figura, um artista que anda pelas ruas de Salvador com indumentárias nada convencionais e recicladas a partir de todo o tipo de material, vai além de uma observação simples e direta. A impressão que me passa a todo instante é o lançamento de um jogo, no qual o espectador precisa experimentar cada cena para avançar na narrativa. É um curta que te convida a vivenciá-lo, sejam quais forem as conseqüências para cada um.

Talvez seja esse o peso do ato de observar, podemos sim ir além, e isso através de uma experimentação da observação, vivenciá-la a partir de nossas bases de conceitos e pensamentos, e assim percebermos algumas inquietações ou não dos elementos observados. Esse primeiro dia me jogou nas entranhas da necessidade de interação com as próprias vivências, acredito que possamos crescer com isso.

28 janeiro 2011

Tiradentes - Dia 1 Parte Um


O dia 1 começou no dia zero.
Sob águas torrenciais cheguei à rodoviária Tietê em São Paulo para pegar o ônibus que me levaria a São João Del Rei, de onde seguiria para a cidade de Tiradentes.
Mas como todo bom dia de chuva na paulicéia, tudo parou e os horários de partida dos ônibus atrasaram significativamente.

Pouco antes da zero hora do dia 1 eu estava carregando meu celular quando uma moça perguntou se ela poderia usar meu carregador por 5 minutos. Nessa ocasião ela estava acompanhada de seu noivo, um rapaz de feições orientais, que logo depois foi embora.

Continuei ao lado do carregador e num determinado momento a moça se aproximou e fez um telefonema para a sua mãe informando o atraso do ônibus e dizendo que ficou sozinha, pois seu noivo teve que ir por conta do metrô, que logo encerraria as operações. Assim que ela desligou, uma outra moça de cabelos tingidos e voz extremamente fina, quase chorosa, brigava com o funcionário da viação, que respondia sempre com um sorriso simpático no rosto. São Paulo estava parada.

Quarenta minutos depois ouvi a noiva conversando com o noivo por telefone. Ela o questionava por não ter ficado um pouco mais, ele parecia se justificar pelo horário do metrô, mas ela insistia. Eles se despediram friamente. Fiquei observando o rosto dela, parecia desolada, mas acredito que muito de sua expressão era cansaço. A moça de cabelos tingidos novamente brigava com o risonho funcionário.

O ônibus apareceu na plataforma 4 horas depois do previsto e à 1h30min da madrugada rumei às Minas Gerais para acompanhar a 14ª edição da Mostra de Cinema de Tiradentes.

O dia 1 foi bastante intenso, participei inicialmente da reunião do Fórum dos Festivais, onde houve importantes debates sobre os desafios dos eventos, principalmente na relação com instituições governamentais como Ancine e SaV/Minc. Após a reunião me dirigi ao Cine Tenda para acompanhar uma sessão de curtas.

O primeiro filme foi o documentário “Aeroporto” de Marcelo Pedroso (PE), cujo início é uma moça num aeroporto observando as pessoas em volta, no restante do filme aparecem diversas experiências de viagens de pessoas distintas. Logo lembrei da minha experiência recente na rodoviária e como o fato de observar pessoas é de certa forma similar à construção de um documentário, mesmo que ele fique apenas na sua cabeça. As duas moças (a noiva e a de cabelos tingidos) viviam a experiência da inquietação. O caos da cidade e o reflexo no atraso dos ônibus geraram um ambiente extremamente hostil para ambas. Isso me fez refletir se essa inquietação era o fruto das ações de uma metrópole ou se fazia parte de algo intrínseco à personalidade de cada uma. Mas a pergunta que fica é se eu precisaria entrevistá-las para ter acesso a isso ou se basta apenas o que meus olhos registraram.

No curta de Pedroso, uma de suas forças está na dinâmica das experiências de viagens, que são histórias comuns, mas com uma intensidade que parece ser transformadora para cada pessoa que a viveu. Observamos constantemente as pessoas, mas o que fica a partir de cada observação? Acredito que muito mais do que julgamentos morais podemos avaliar o quanto cada experiência também faz parte de nós mesmos e assim avançarmos no nosso autoconhecimento.

A sessão encerrou com outro curta pernambucano: “Mens Sana in Corpore Sano”, ficção dirigida por Juliano Dornelles. Iniciando como um documentário, acompanhamos a rotina de um fisiculturista, principalmente seus treinamentos. Aos poucos temos acesso às perturbações em sua mente na rígida missão de atingir a excelência no esporte. Quando o filme se estabelece definitivamente na ficção, o espectador é levado a uma das mais inusitadas experiências.

Novamente a observação como expressivo elemento narrativo. Ao acompanharmos a rotina daquele homem, como poderíamos apreender as inquietações de sua mente? O diretor nos levou a elas diretamente, deu um passo que meus olhos jamais poderiam dar, mas eu poderia usar a imaginação, levando ou não às conseqüências apresentadas por Juliano.

Saí da exibição pensando sobre o ato de observar e se existe necessidade de ir além. Como chegar naquilo que define as angústias e inquietações, propulsoras de nossos atos? Lógico que a resposta não se encontra tão facilmente, mas novamente o primeiro e o último filme de uma próxima sessão me trariam elementos para pensar mais um pouco sobre o assunto.

Continua na parte dois (em breve)