24 abril 2011

Continuar viva

Era o seu filho que estava caído embaixo de uma bicicleta do outro lado da rua. Ela correu e chegou até ele. O joelho do menino estava bastante machucado e o sangue escorria pelas finas pernas. Foi um susto e o menino sobreviveu.

Dois dias depois um amigo de seu filho lhe procurou, disse a ela que na queda da bicicleta o menino havia perdido uma sacola que alguém levou embora se aproveitando da situação. A mãe ficou confusa e queria saber que sacola era essa e o que havia dentro. O amigo de seu filho apenas falou: - Tudo que a senhora precisa para continuar viva.

A mãe não levou a sério, acreditou que era uma brincadeira.

Uma semana depois do incidente com a bicicleta, o filho cai de cama e uma forte pneumonia obrigou a internação em um hospital da cidade. Ele piorou muito rápido e após três dias de internação os médicos não tinham mais esperanças, apenas aguardavam pelo pior. A mãe chorava, os exames indicavam uma bactéria fatal.

A bicicleta foi destruída e queimada num terreno perto do prédio onde moravam, exatamente vinte dias depois da queda que ralou o joelho do garoto, que agora estava morto e enterrado. A mãe enlouqueceu e precisou de auxílio psiquiátrico.

Um dia ela foi uma mãe, hoje ela apenas costura sacolas imaginárias.

21 abril 2011

A estrada da felicidade

Germana dirigia seu carro numa estrada de terra. O sol brilhava forte e tudo era muito quente.

Se existisse um conceito de felicidade, ele estaria presente no coração de Germana, pois seus 25 anos não eram decepcionantes, não conquistou tudo que queria, mas tinha a certeza de que seu automóvel chegaria ao destino mais certo de sua vida.

Um homem muito velho estava parado na estrada. O carro de Germana passou por ele e logo depois freou. Ela virou o pescoço e ficou olhando para aquele homem, imóvel debaixo de seu boné surrado. Com muita calma, Germana encontrou sua máquina fotográfica na confusão de coisas que era a sua mochila.

Germana desceu do carro e caminhou até o velho.

Os olhos do homem se viraram para ela e com uma voz cansada ele disse "bom dia".

A moça respondeu com um sorriso e os olhos daquele solitário idoso se voltaram para a terra seca da estrada. Germana ensaiou preparar a câmera e antes do visor chegar em seus olhos, ela desistiu. Sentiu, por alguma inexplicável sensação, que aquilo deveria pertencer somente à sua memória.

O suor escorria pela testa de Germana.

O velho homem ajustou o boné na cabeça e em seguida cutucou uma das unhas de sua mão. Germana estava a menos de um metro deste homem e sentiu que na verdade havia uma distância muito maior. Tentou medi-la com a felicidade de seu coração e sentiu o pior sentimento de egoísmo e arrogância, por que ela deveria se julgar muito mais feliz que aquele homem? Percebeu que a foto que ela não tirou buscaria demonstrar isso, uma falácia sem tamanho. Lembrou do filme macedônio "Antes da Chuva".

Germana disse "foi um prazer conhecê-lo", o velho levantou o rosto e retribui com um sorriso aconchegante de poucos dentes.

Um blues em alto volume explodia no interior do carro de Germana enquanto ela dirigia para o seu verdadeiro destino, pelo menos até aquele momento ele era realmente verdadeiro.