26 junho 2011

Uma garota que gosta de Blur

Estação ferroviária Júlio Prestes, São Paulo, Brasil.

São 11 horas de um sábado, o movimento de usuários do trem urbano não é tão grande.

Marcelo, 33 anos, entra no saguão da estação com uma pequena bolsa a tiracolo. Ele se aproxima da catraca. Um trem chega. Ele observa atentamente os passageiros que desembarcam. O trem parte e ele volta para a entrada da estação.

Ali encontra uma amiga de nome Joana, um pouco mais velha que ele. Marcelo pergunta se ela trouxe o celular dele, Joana entrega o aparelho para Marcelo que o liga em seguida. Joana pergunta que horas ele marcou com a garota, Marcelo responde que às 11.

Joana pergunta a idade dela, e o amigo diz 22. Marcelo se despede da amiga e se aproxima da catraca novamente.

Joana fica um tempo parada na entrada da estação, depois volta até o amigo e pergunta se ele trouxe a câmera digital.

Joana tira várias fotos da fachada da estação. Após um tempo Marcelo se aproxima e diz que está preocupado, a garota demora demais. Ele tenta ligar pra ela, mas não consegue resposta, dá na caixa postal. Joana diz que não entende o que Marcelo viu nessa menina, que pra completar mora muito longe.

Marcelo apenas fala: - Ela gosta de Blur.

Marcelo volta para junto da catraca. Vários trens chegam e nada da garota. Joana se aproxima e lhe entrega a câmera, quando ela vai se despedir, Marcelo pergunta se ela poderia ficar um tempo ali com ele. A princípio Joana não aceita, mas depois cede.

Já é meio-dia. Joana bebe água na boca de uma garrafa de plástico, e enxugando os lábios com a mão, ela diz para Marcelo desistir. Marcelo bebe um pouco da água e resolve ir embora. Na entrada da estação Marcelo pede a câmera de volta para Joana. Ela diz que devolveu faz tempo. Marcelo diz que impossível, não está com ele. Eles voltam para junto da catraca, procuram nas proximidades e não encontram nada.

Marcelo e Joana brigam, trocam desaforos e um joga na cara do outro certas intimidades infames.

Joana pede o celular de Marcelo emprestado para tirar novamente as fotos. Os olhos dele se arregalam como se não acreditasse no que ouviu, mas ele entrega o celular, talvez pra evitar mais discussões.

Marcelo volta para junto da catraca e observa os trens que chegam.

Entre a quarta e a quinta foto, o celular de Marcelo toca. Joana observa o amigo de longe enquanto escuta "to the end" como toque musical do aparelho.

08 junho 2011

Filme gay é censurado no Acre

Caros, abaixo uma carta aberta da produtora e do diretor do curta "Eu Não Quero Voltar Sozinho". O filme foi censurado por conta de sua exibição em sala de aula num projeto pedagógico no Acre.
Solicito a todos que divulguem e lancem debates sobre esse grave ataque ao curta-metragem brasileiro, à cultura e à possibilidade de avançarmos na construção de uma sociedade com mais compreensão de nossas diferenças.

"Queridos amigos e colegas,

No início da semana recebemos a notícia de que a exibição do curta Eu Não Quero Voltar Sozinho, como parte do programa Cine Educação, havia sido censurada no Acre.

O programa Cine Educação, uma parceria com a Mostra Latino-Americana de Cinema e Direitos Humanos, tem como objetivo "a formação do cidadão a partir da utilização do cinema no processo pedagógico interdisciplinar" e disponibiliza diversos filmes cujos temas englobem os direitos humanos, de modo que professores escolham quais são mais adequados para serem trabalhados em aula.

Na semana passada, no estado do Acre, uma professora escolheu o curta Eu Não Quero Voltar Sozinho e exibiu-o para seus alunos. Para aqueles que não conhecem, a trama narra a história de Leonardo, um adolescente cego que, ao logo do filme, vai se descobrindo apaixonado por um novo colega de sala.


Alunos presentes na exibição confundiram o curta metragem com o "kit anti-homofobia" e levaram a questão aos líderes religiosos, que mobilizaram políticos da região com o intuíto de proibir o projeto Cine Educação como um todo. Nenhum desses representantes públicos deu-se ao trabalho de ir atrás da verdade e descobrir que se tratava de um programa pedagógico com o intuito de levar o debate sobre direitos humanos para a sala de aula. Mais uma vez no Brasil, a educação perde a batalha contra o poder assustador das bancadas religiosas e conservadoras.

Neste momento, o programa Cine Educação está paralisado. Enquanto isso, os secretários de Educação e de Direitos Humanos do Acre estão articulando com o governador a possibilidade de garantir sua continuidade, enquanto os líderes evangélicos forçam o cancelamento definitivo do programa. Pelo que sabemos, mesmo que o programa seja reativado, o curta Eu Não Quero Voltar Sozinho será excluído do catálogo e não mais ficará disponível para que professores o utilizem no debate de questões que envolvem algo tão elementar quanto a sexualidade humana e tão importante quanto a deficiência visual.

De forma arbitrária, em uma república federativa cuja Constituição atesta um Estado laico, a sociedade está sendo privada de promover debates. Como pretendemos que adolescentes consigam respeitar a diversidade e formem-se cidadãos lúcidos, pensantes e ativos se informação, arte e cultura (sem qualquer caráter doutrinário) lhes são negadas?

Eu Não Quero Voltar Sozinho não é um filme proselitista, tampouco ergue bandeiras de nenhuma natureza. É apenas uma obra de ficção amplamente premiada em festivais de cinema no Brasil e no exterior, cujos predicados artísticos e humanos transcendem qualquer crença. Ademais, se assuntos referentes à orientação sexual dos indivíduos e seus respectivos direitos civis está na pauta do Supremo Tribunal de Justiça e do Congresso Nacional, por que não debatê-los em sala de aula? Que combate sombrio é esse, que reacende a memória de um obscurantismo Inquisidor?

Produtores do Eu Não Quero Voltar Sozinho

Daniel Ribeiro e Diana Almeida"

http://www.lacunafilmes.com.br/sozinho/


P.S.: Segue o link para o curta, que está disponível no YouTube: http://www.youtube.com/watch?v=1Wav5KjBHbI

Site do Cine Educação: http://www.cinemateca.gov.br/page.php?id=91