27 abril 2016

Nas águas de suas próprias pedras

Havia em todas as suas pedras uma pequena marca que parecia um 'V', mas quando se chegava perto e olhava com cuidado, percebia-se que era uma cachoeira e um estreito fio de água descendo pelas pedras de cada pedra. Um dia ela resolveu espalhar todas as suas pedras pelo chão liso e deitar sobre elas. Meditou.

12 fevereiro 2016

Desapareceu seguindo aos gritos por uma das avenidas

Num cruzamento de avenidas um homem de meia idade gritava revoltado, não consegui identificar o motivo de seu revolta, ele estava furioso e chegou a dizer que se tornaria um terrorista. Ele desapareceu seguindo aos gritos por uma das avenidas. Sempre fico sensibilizado com essas manifestações de perda da lucidez, em especial quando elas são expressas por raiva e rancor. Sinto que dentro daquela alma há um desespero, algo muito mais forte grita dentro dela e o que acessamos talvez não represente nem a metade desse desespero interior. Parecem pessoas no final de uma rua sem saída, parece que apenas uma parede opressora se apresenta à frente delas. O desespero interior alheio me faz sentir como se estivesse na sala escura, sem conseguir tatear e acreditar em mais nada, e o ser humano é nitidamente um fantasma que pode aparecer a qualquer momento e iluminar.

10 fevereiro 2016

Ali, o futuro imediato

Consideremos que o futuro imediato será sempre algo muito rápido e que ali se encontram nossos desejos. A vontade e o conjunto de metas parecem uma opressão, mas apenas se pensarmos que o futuro é distante. Por isso me encontro em um flerte com o futuro imediato, onde realmente posso firmar bases para fugir de qualquer tipo de ansiedade. A rapidez que temos nesse futuro imediato nos leva ao desapego, característica que considero fundamental para melhor entendermos nossa passagem por esse mundo. Passou e foi rápido, essa é a lei. Não precisamos nos desvincular dos sentimentos, são eles que nos moldam perante todas as nossas experiências.

08 fevereiro 2016

Firmes posições

Os ventos contrários. A força dos ventos pode ser destruidora, verificar a direção deles e se mover conforme sua disposição é um passo de prudência que todos nós podemos exercer a medida que compreendemos o domínio das forças não progressistas à nossa volta. Parece sempre que uma ética de bom senso deseja suplantar posições bem definidas. Pra mim isso é hipocrisia e desperdício. Os ventos contrários. A destruição é eminente, pode ser atenuada se mantemos firmes nossas posições. Os discursos enganadores são ventanias medíocres sempre na mesma direção dos ventos contrários, enganam como brisas. Ao se refrescarem nessas brisas, os progressistas pouco firmes se deixam enganar e favorecem a destruição dos ventos contrários. Não importa, sempre reconstruiremos a luta, independente dos estragos que ficarem.

06 fevereiro 2016

Dinâmicas que movem

Sempre considerei que as forças mais produtivas estão na solidariedade e compreensão. Apreender essas duas dinâmicas nos faz mover com mais serenidade as coisas do cotidiano e do mundo. Isso ao mesmo tempo nos move para abrir mão de um certo egoísmo em que colocamos nós mesmos e os nosso próximos em um primeiro plano custe o que custar, fato que considero nobre, mas romper esse egoísmo é lançar-se sobre o outro, é exercitar uma verdadeira troca, que no meu entender resulta em conhecimento e aprimoramento de nossas próprias convicções para longe de particularismos, achismos e individualismos, e para próximo de um verdadeiro humanismo.

05 fevereiro 2016

Estranhamento complexo de domínio das próprias forças

Resolvi parar. O objetivo é a centralização no único caminho que está se abrindo, a ilusão de caminhos diversos acabou. Por vezes a sensação é de um idiota completo, mas o que tudo se mostrou foi a iluminação para além do que pode significar qualquer dado material nessa vida. A força descomunal em se fazer compreender, a repressão de se fazer ouvir me consumiu, o cansaço gerou o desanimo. Acabou. No que centralizo agora pode me fazer acreditar que estou num individualismo completo, porém conhecer e estudar as mazelas do individualismo agressivo de nossos tempos me faz ser consciente onde estou centralizando. O estranhamento complexo de domínio das próprias forças, a lucidez de que o abraço amplo limita a proximidade. Um afastamento que aproxima, essa é a sensação, mas não considerarei isso, paradoxo bobo demais. Afastamento, é isso, por ele só.

20 janeiro 2016

Sobe e desce de uma pessoa nela mesma

O elevador está parado no oitavo andar, ela está no sexto. Resolve descer pelas escadas.

Para no quinto. Não pode deixar sua ansiedade lhe consumir.

Depois de cinco minutos o elevador sai do oitavo e obviamente para no sexto.

O elevador demora no andar de cima.

Ela resolve voltar e encontra o elevador ali parado, sem ninguém dentro dele. Ela entra e aperta o T de térreo. Ela não tem carro na garagem.

O elevador desce e para no quinto.

Demora para descer, ela aperta novamente e novamente e novamente o T. Nada.

Ela sai do elevador e desce as escadas apressadamente.

Tropeça no último degrau, bate a cabeça e vai parar no hospital.

O homem ao seu lado na enfermaria levou um tiro na perna e lhe explica os detalhes.

Quando ela volta pra casa resolve subir os seis andares pela escada.

Ao entrar embaixo do chuveiro tem a certeza de que continua sendo a mesma pessoa.