21 dezembro 2008

Cabelos castanhos com luzes [PARTE II]

Primeira ligação.
Do outro lado uma voz rouca de mulher atendeu muito rápido, Maria gaguejou um pouco no início mas logo falou o que queria com muita segurança.

Antes da segunda ligação refletiu sobre a noite anterior e percebeu uma coisa que talvez tenha lhe magoado.

No balcão de um bar repousava um copo de cerveja, na testa suor e na cabeça uma crise infernal. O estrangeiro que não era estrangeiro não parava de pensar em Maria, porém percebeu o quanto foi rude, após o beijo da praça não guardou nada dela, nem telefone, nem e-mail, nada! Era só o começo.

Segunda ligação.
Ninguém atendeu.

Terceira ligação.
A amiga de Maria atendeu e disse que não podia fazer nada, se a segunda ligação não atendeu é porque não havia ninguém.
Sua nuca suava novamente.

Duas mulheres de cabelos amarelos faziam suas unhas, as suas manicures eram jovens e franzinas. Um falante cabeleireiro massageava a cabeça de Maria do lado oposto do apertado salão. Um ventilador no canto refrescava levemente o ambiente.
Os longos cabelos de Maria agora eram curtos, chanel.
Maria saiu do salão carregando uma charmosa bolsa de pano.

Forte calor. Maria atravessou a cidade.
Colocou sua bolsa de pano sobre um balcão e iniciou uma negociação que demorou muito mais do que ela gostaria que tivesse durado.
Enfim conseguiu um bom dinheiro por seus cabelos. Eles despertavam muito o desejo. Mas agora era passado, seu cabelo estava chanel e pronto.

Maria resolveu dois problemas de uma só vez: dispensou a peruca da segunda ligação e conseguiu o dinheiro que precisava para o assunto da primeira.

A mulher de voz rouca recebeu Maria num apartamento muito aconchegante. Maria tinha imaginação, por isso criou um universo bem diferente para aquele apartamento, havia gostado da idéia de imaginá-lo com cores escuras e fortes, e também com muitos gatos circulando pelos ambientes. Porém aquele lar possuía paredes de cores claras e um cachorrinho meigo. A mulher de voz rouca lhe entregou um papel excessivamente colorido, Maria prontamente repassou o dinheiro a ela, que não conferiu o valor e apenas orientou Maria para que não transformasse aquilo em vício.

O plano de Maria parecia um desafio, ela buscava uma aventura, sem dúvida. Ao pensar em aventura, novamente lembrou-se da noite anterior, não conseguia chegar a uma conclusão se havia gostado ou não, talvez não tenha entendido o desfecho. Resolveu não mais pensar nisso.

O estrangeiro que não era estrangeiro estava em outra cidade, talvez ali pudesse encontrar um pouco de Maria, lembrava dela nua na cama, de bruços, contando sobre os prazeres que aquela cidade pode oferecer, um lugar preparado para os errantes, para aqueles que mergulham no desejo de se perder. Ele percorria as ruas com Maria em seus pensamentos, não compreendia o porquê de sua ações naquela despedida em que sentiu o beijo dela pela última vez. Gostaria de encontrar Maria nem que fosse em outra mulher. Estava atordoado.
Transou intensamente com três prostitutas naquele dia.

Não tão longe desse sofrido amante, Maria desembarcava com seus cabelos curtos e o convite colorido.
Foi a um hotel e dormiu.

(continua...)

19 dezembro 2008

Centavos

Zélia faz faxina.
Cássia guarda os centavos.
Roberta pede para Cássia pintar seus cabelos.
Nena não gosta de Roberta.

Zélia faz novamente a faxina.
Cássia conta seus centavos.
Roberta não gosta da tinta de seus cabelos.
Nena transa com o namorado de Roberta.

Zélia não faz a faxina, acabou a água sanitária.
Cássia acha 10 centavos na calçada.
Roberta chora.
Nena cuida de uma velha senhora

Zélia é casada com o irmão de Cássia, que é namorado de Roberta.

Nena pinta seus cabelos de loiro.

16 dezembro 2008

A Janela de Bogdanovich

Num desses fins de ano em que passei em São Paulo busquei aproveitar o tempo para conhecer um período do cinema americano um tanto obscuro pra mim: os anos 70. Conheço uma certa filmografia dessa época como os filmes de Scorsese, Kubrick, Woody Allen, Spielberg, Altman, entre outros, mas queria ir além e conhecer outros filmes e diretores. A motivação para esse estudo surgiu quando assisti aos extras de Touro Indomável, onde em um determinado momento se comenta que muito provavelmente alguns anos depois de sua realização (1980) nenhum estúdio toparia produzi-lo. Será que este filme, além de ser uma das obras mais expressivas de Martin Scorsese, também estaria marcando o fim de uma era dentro do cinema americano? Isso talvez possa ser melhor digerido ao ler o livro "Easy Riders, Raging Bulls" de Peter Biskind, no qual ele aborda esse período dos anos 70 do cinema americano que na verdade tem sua gênese já no final dos anos 60. Longe de fazer uma análise detalhada desse período ou tentar um denominador comum entre os filmes, buscarei aqui expor um pouco de minhas impressões através de um filme de Peter Bogdanovich chamado "A Última Sessão de Cinema" (1971).

Nova-iorquino, filho de imigrantes sérvios, Bogdanovich inicou sua carreira programando filmes no MOMA de Nova York e também como critico de cinema, inspirado, não por acaso, nos ventos que chegavam na América a partir da Nouvelle Vague francesa. Aos 32 anos dirigiu "A Últiima Sessão de Cinema", um filme que se passa numa pequena cidade dos EUA no início dos anos 50, e que traz em sua narrativa as experiências vividas por jovens principalmente nas suas descobertas sobre sexo e amor. A cidade, situada no Texas, está em pleno declínio, e o vazio e a melancolia tediosa se manifesta no único cinema que ali existe e que está às vésperas de seu fechamento, causado principalmente pelo advento da televisão. Toda essa atmosfera de abandono e decadência está expressa na fotografia em preto e branco do filme, mas também nas relações entre seus personagens. Os adolescentes são os protagonistas, que ao investirem em suas descobertas encontram castelos de areia, que se desmancham pela falta de consistência gerada principalmente pelos valores que aquela pequena comunidade impõe aos seus habitantes, baseados na hipocrisia e numa falsa moral. Os adultos, coadjuvantes na história, representam a decadência em si, todas as perspectivas de suas vidas não extrapolam os limites daquela cidade que definha lentamente e promove distâncias entre as pessoas.

É um corte na montagem do filme que me chamou a atenção pelo seu significado dentro de toda a narrativa. Jeff Bridges interpreta Duane, um jovem inconseqüente que flerta desde o início com Jacy, interpretada pela jovem Cybill Shepherd, e que faz parte da elite da cidade. Chega o aguardado momento em que irão para a cama pela primeira vez, fato que gerara em Duane uma forte expectativa por se tratar de uma conquista comparável à vitória de um campeonato, principalmente por causa de sua condição social, inferior à dela. Eles se encontram em um simples motel, as amigas de Jacy aguardam ansiosamente do lado de fora. Porém a medida que as coisas evoluem dentro do quarto, Duane percebe que Jacy não corresponde em nada ao que ele esperava daquele encontro, e ela ao perceber que ele se frustrara, revolta-se e surge uma discussão na qual Duane não encontra argumentos e deixa o quarto. Ao sair, ele passa pela amigas de Jacy com um semblante de satisfação, as moças então adentram no quarto e encontram Jacy descabelada, enrolada no lençol e simulando que fora algo maravilhoso. Logo em seguida vemos vários jovens da cidade num coral na escola cantando em tons firmes uma canção de exaltação ao estado do Texas. Essas duas cenas justapostas, a hipocrisia de uma jovem perante as amigas e o hino a uma honra perdida no tempo, conseguiu resumir toda uma afirmação de valores decadentes da sociedade americana, que no início dos anos 70 estavam sendo questionados com toda força pelos jovens cineastas que então surgiam e traziam para as telas personagens como Duane e Jacy, cidadãos americanos sem glamour, pessoas comuns de cidades comuns e que vivenciam seus dilemas imersos em um vazio propiciado pelas exigências da sociedade para que eles sejam quem ela deseja que eles sejam e não eles mesmos, com seus defeitos e angústias.

Bogdanovich faz parte de uma geração que nos trouxe excelentes diretores como Scorsese, Terrence Malick, John Schlesinger, Cassavetes, cujos filmes desse período buscavam uma reflexão mais profunda da América em sua volta, cada filme era questionador, o que enriquece a função do cinema como uma janela para que possamos nos lançar no autoconhecimento e assim pensar no que realmente é preciso para transformar não somente a sociedade, mas também nossas relações mais próximas com os que nos cercam.

A Última Sessão de Cinema (The Last Picture Show), EUA, 1971.

04 dezembro 2008

Cabelos castanhos com luzes

Fazia muito calor.
Maria estava completamente suada. Não havia dançado, encontrava-se ali apenas para encontrar uma amiga de sua confiança. O lugar era muito abafado.

Cerca de 30 minutos antes, Maria fechava uma porta atrás de si, um estrangeiro lhe devia dinheiro e disse que não lhe pagaria nenhum tostão, não havia gostado do seu serviço. Calma, Maria não é garota de programa, ela é uma fazedora de desenhos. O dinheiro, pelo menos aquele, era essencial para o plano de Maria.

Porão, música alta, suor e uma frustração misturada com revolta percorriam as veias de Maria. Ela decide conversar.

Expõe tudo sobre o estrangeiro a um outro estrangeiro que não era estrangeiro, este lhe ouvia, opinava discretamente e aproximava cada vez mais o seu rosto do dela. O suor descia pela nuca de Maria, sua cabeça girava, tudo estava realmente confuso naquele momento. Maria tinha um plano.

O estrangeiro que não era estrangeiro desapareceu daquele porão, Maria se afastara dele por um momento, um outro escutador estava presente e parecia mais atraente. Na verdade, esse outro escutador não precisava escutar nada, Maria nada queria lhe contar, apenas lhe beijar.

Maria, com o plano plenamente concebido em sua cabeça, decide ir embora, não é possível precisar se o outro escutador trocou beijos com ela ou não. Maria já estava no pé da escada.

Duas horas antes, a amiga de Maria, por telefone, lhe falou da festa no porão abafado, fazia um tempo que elas não se viam. No plano de Maria essa sua amiga era fundamental, pois é uma pessoa comunicativa e que sabe fazer amizades muito rapidamente.

No porão, já com a nuca e a testa suando, Maria encontrou sua amiga com um grupo de estrangeiros. No intervalo entre o primeiro e o segundo escutador as duas conversaram muito rapidamente sobre o plano. Somente três pessoas escutaram Maria naquela noite. Sua amiga gostou daquilo que chamou de um dos planos mais engenhosos para se conseguir algo tão exótico, Maria tinha imaginação, era o que lhe levava a crer ter acertado ao seguir a profissão de fazedora de desenhos, muito ao contrário do que pensava o estrangeiro caloteiro. A amiga lhe deu dois números de telefone e falou: "Amanhã às duas da tarde".

Trinta minutos depois, ali estava Maria no pé da escada e de repente o estrangeiro que não era estrangeiro surge e aproxima o seu rosto do modo que ele desejou a noite toda. Beijou Maria na boca. Maria correspondeu. Os dois estavam suados, ela um pouco mais que ele.

Um táxi, ruas desertas e dois amantes.

A madrugada avança, Maria e o estrangeiro que não era estrangeiro estão juntos num quarto, abraçados. Para ele foi um momento único, admirou a boca de Maria como nunca fizera antes com outra mulher e não cansava de sentir de perto aqueles olhos tão intensos.

Uma da tarde do dia seguinte.
Maria se veste, às duas terá que fazer as ligações.

Eles caminham pelas ruas, Maria conta aventuras de algumas viagens, ele a escuta e não pára de pensar nela.
A despedida é numa praça, seguem para lados opostos após um beijo, que jamais será esquecido por ele.

Apressadamente Maria dá prosseguimento ao seu plano.
No caminho até sua casa vem à sua mente um problema: o plano precisa de dinheiro, e ela contava com o valor do calote que levou.

(continua...)

[AGORA PENSE EM ALGO EXÓTICO E SUGIRA PARA O PLANO DE MARIA. ESCREVA NO COMENTÁRIO. Tyler Durden Fora do Caos TORCERÁ POR SUA IMAGINAÇÃO]

21 novembro 2008

Pássaro

Para se motivar ele entendeu que a única forma capaz de dar conta de sua angústia era a possibilidade de se libertar do que ele chamava de pássaro.

O pássaro lhe dava asas, permitia sua fuga quando sempre assim a desejava, estranho porque a sua busca estava no conhecimento de algo pouco acessível ao seu modo de ver e perceber o mundo. Era uma busca filosófica. Mas isso deixemos para uma outra hora.

Ele estava apenas admirando uma janela, nada era siginifcativamente atraente para ele à sua frente. Motivar sua própria vida, era o que desejava naquele momento. Fechou a janela e logo depois os seus olhos. Acordou numa rua deserta, sem casas, apenas cercas de ambos os lados. O horizonte era formado por árvores espessas e de baixa estatura, podia crer que era um cerrado, mas logo deixou de pensar nisso.

Para qual lado seguir?

Ouviu se aproximar o som que por toda uma vida fez crescer a sua angústia. Era o pássaro.

As asas batiam com uma força espetacular e quando enfim ele pôde perceber aquele animal em pleno voo, quis arrancar suas próprias entranhas com a força de um Hércules.
Mas forças sempre lhe faltaram.

Eis a ave crescendo à sua frente. Fechou os olhos novamente e quando os abriu percebeu que estava no mesmo lugar. Quis saber se aquilo representava seu fim.

O pássaro voou sobre sua cabeça e logo se transformou em uma figura que ele jamais vira, muito mais grosseira e assustadora. Ele correu, correu até perder todas as energias de suas pernas.

Estava ali deitado em um solo arenoso, amargurado e pouco esperançoso, e sabia que permaneceria assim, com o pior dos sentimentos, o ódio de si mesmo.

Dias se passaram até conseguir se levantar e ao dar seu primeiro passo sabia que nenhum pássaro o atormentaria.

Sorriu enfim.

31 agosto 2008

Doce Café

Havia um significado no seu café, servido fora de hora e com muito açúcar.
Ela bateu na porta do meu quarto, seus olhos tristes queriam me dizer alguma coisa, mas tudo que ela fez foi me perguntar se eu estava afim de um café.

Depois que ela foi embora liguei a TV e adormeci.

Era muito difícil morar numa pensão, pois apesar de ter um quarto só pra mim, não conseguia evitar as consultas que me faziam. Aquele lugar tinha um dom para hospedar depressivos, amargurados e solitários carentes. Eu os recebia com paciência, e no fundo sentia que aquilo poderia me enriquecer de algum modo como experiência de vida. Mas não era fácil, o problema não estava em recebê-los ou escutá-los madrugada adentro, o fator mais complicador era a carga de energia negativa que eles deixavam naquele espaço que significava pra mim o meu principal refúgio de privacidade. Essa negatividade gerava em mim uma dor de cabeça insuportável.

E foi assim que ela se aproximou de mim.

Muito antes daquele café ultra doce, ela me parou na entrada da pensão e me perguntou se poderia, além de lavar as minhas roupas, também passá-las. Falei pra ela que o ato de passar minhas próprias roupas funcionava pra mim como uma terapia e que também não teria como lhe pagar por isso. Ela foi enfática e disse que faria tudo pelo mesmo preço.
Eu disse sim.

Duas vezes por semana eu encontrava minhas roupas limpas e passadas em cima da cama.

Desde então nunca mais conversei com ela, somente o essencial sobre os serviços que ela prestara pra mim.

Mas aí ela bate na porta com aquela xícara na mão e tudo o que percebo são seus olhos tristes. E num sentimento de orgulho próprio, fiquei com a certeza de que ela queria me falar alguma coisa que representasse o quanto eu era atraente para ela.
Vã inocência.

Dois dias depois, entrei no quarto e minhas roupas não estavam ali, ótimo pretexto para ir falar com ela.
Cheguei na lavanderia e ela se encontrava sentada num pequeno banco de madeira.
Não enxergava seus olhos, os quais me atraíram para aquela situação patética, mas via suas pernas sob uma saia encolhida até o meio das coxas.

Como é bom morar sozinho...

Perguntei sobre minhas roupas.
Ela respondeu que foram queimadas.

Nunca mais ninguém me procurou para pedir conselhos e nunca mais senti dores de cabeça.

06 junho 2008

É só um espelho

Ela não fuma. Tem 28 anos, cabelos vermelhos e respira a fumaça ao seu redor.
Está numa mesa de bar.

Um dia ela fumou.
Sem saber como descarregar as aflições de seu primeiro emprego, o cigarro era um refúgio, um prazer, uma satisfação para afastar de seu consciente tudo que a exigência de uma responsabilidade aos 17 anos lhe consumia.

Toma cerveja, está quente e a sua testa está suada. Deseja entrar naquela noite com muita vontade e libido, mas a maré não colabora. Nenhum dos fumantes ali está em seus planos, um outro bar é a sua meta. É nisso que pensa quando uma moça muito simpática lhe pergunta:

- Tem o telefone da Morgana?

Quer esfregar o suor da testa na boca dessa maldita moça simpática.
Morgana um dia foi sua amiga e um dia deixou de ser, então responde:

- Não.

Vai ao banheiro.
Uma moça, que também tem os cabelos avermelhados, fuma um cigarro e se contempla em frente ao espelho quebrado.
Tudo que ela faz é retocar o batom ao lado dessa fumante e pensa: "É só um espelho."

De manhã facilmente se lembra o quanto libidinosa foi a noite passada.

01 junho 2008

Varanda

Olhos vazios.
Ali naquela garagem tudo que ela lembrava era do momento em que ele se foi. Com a vassoura continuou varrendo o chão empoeirado, depois fechou o portão e o trancou com um grosso cadeado.
Com os mesmos olhos vazios olhou para a fachada da casa da garagem trancada, precisava de algo para continuar, pensou na festa mais à noite, seria bom ver pessoas falando alto, cerveja na mesa e outras coisas que distraem.

Chegou na festa que acontecia num pequeno apartamento no bairro de Sta. Cecília. Era no segundo andar e da pequena varanda se avistava uma pequena praça. Não havia tantas pessoas quanto ela imaginava que poderia haver, todos eram seus conhecidos e a dona da casa era uma moça baixinha de um sorriso aberto e gostoso. Elas se conheceram num curso de teatro, que frequentaram apenas duas aulas para se tornarem grandes amigas.

Seus vazios olhos não permitiram conversar com muitas pessoas, vagueou pela festa com uma taça de vinho e estava sempre sentada em algum canto do apartamento observando as pessoas.

Começava a amanhecer e ela estava sentada num puf de frente para a varanda, ao seu lado uma moça de saia comprida dormia no chão; na cozinha, a dona da casa guardava as sobras da festa; e perto da porta um casal conversava baixinho sentado no chão.

Pensou: outra festa que acaba. Lembrou de uma música de um banda chamada Drugstore: "Another Party is Over".
Desistiu de refletir sobre a garagem vazia, tudo estava varrido para sempre, ainda tinha vinho naquele final de festa e naquela varanda à sua frente estava uma pequena abertura para um dia que nasce, basta isso.

Chegou na parada de ônibus. Sentou nos bancos e esperou. Perto dela uma mulher de meia idade esperava o coletivo em pé, bolsa no ombro e uma sacola plástica pesada na mão, seu olhar também era vazio, mas parecia mais perdido.

E foi assim que dentro do ônibus ela resolveu continuar para nunca mais se perder.

08 maio 2008

Tristeza

Pois é,

FLA eliminado da Libertadores de forma trágica.
É triste, mas é só futebol, os 90 minutos passaram.
E tudo a fazer é continuar com o coração rubro-negro.

06 maio 2008

Alegria!!

Um dia Romário disse que no dia do seu nascimento Deus apontou o dedo e falou 'esse é o cara!', mas acredito que uns 15 anos depois o dedo divino tomou outra direção: Manoel de Brito Filho, quem é? É o iluminado OBINA, atacante do mengão e o atual salvador rubro-negro.

Eu estava lá, dia 4 de maio de 2008, junto com 80.000 pessoas no Maracanã e vendo o Flamengo sem rumo no primeiro tempo, que depois de um frango do goleiro Bruno perdia por 1x0 para o Botafogo. Segundo tempo: Entram Diego Tardelli e ele, OBINA. Na primeira bola na direção de sua cabeça, o rubro-negro empata. OBINA salva e abala as estruturas do Mário Filho.

Torcida não pára, empurra o Mengão e Diego Tardelli vira o jogo 2x1. Daí era só alegria, Botafogo acuado, Flamengo sobrando em campo. E mais uma vez a estrela brilha: OBINA faz o terceiro e somos bi-campeões do carioca.

Ao som de 'mamãe eu quero... dá a chupeta para o bebê não chorar' a torcida alvinegra deixa o estádio e ao fim do jogo é Mengão campeão e OBINA consagrado.

Mas é bom lembrar que o escolhido e verdadeiro salvador nasceu dia 3 de março de 1953, Artur Antunes Coimbra: ZICO!

02 maio 2008

Frutas & Vento

A hélice verde escuro de um ventilador gira.
O ventilador está no chão de uma casa cujo assoalho é de tacos.
Os cabelos pretos encaracolados de uma mulher de 25 anos esvoaçam com o vento que chega deste ventilador.
Os olhos dessa mulher estão adormecidos e os músculos da face relaxados.

Pedaços de frutas caem dentro do copo azul claro de um liquidificador.
Um copo de leite é derramado sobre essas frutas. Uma mão feminina tampa o copo do liquidificador.
A mesma mão, com unhas pintadas de ciano, aperta o botão da potência mais forte (talvez #3).
O liquidificador não funciona.
Na pia, ao lado do liquidificador, está a mulher de unhas ciano, ela tem 33 anos e está cabisbaixa com as mãos apoiadas na pia.
Essa mulher vai até a porta da cozinha, que está aberta, escora-se e ali fica parada.

Os pés da mulher de cabelos encaracolados repousam sobre uma almofada laranja.
Seus cabelos esvoaçam.

A mulher de unhas ciano tenta fazer o liquidificador funcionar na tomada do quarto.
Depois na tomada do outro quarto. Na tomada do banheiro.
Por fim numa tomada do corredor.
Sem sucesso.

A hélice verde escuro do ventilador pára de rodar.
Ouve-se o som ensurdecedor do liquidificar funcionando.
Os olhos da mulher de cabelos encaracolados se abrem.

A mulher de unhas ciano está em pé com o copo azul claro do liquidificador na mão. Ela diz:

-Essa é a única tomada que funciona na casa.

A mulher de cabelos encaracolados se levanta e vai ao banheiro.

21 abril 2008

Mudança e esperança

Há um tempo comento com meus próximos que vivemos um momento especial na América do Sul, e me preocupa talvez a pouca atenção que se dá ao que acontece nesse continente. A eleição de Lugo no Paraguai, seguida de um último grito de esperança dos paraguaios por mudança, insere o nosso vizinho no rol de governos de esquerda, eleitos democraticamente (nunca esqueçamos disso), que têm realizado novas perspectivas para um continente historicamente marginalizado e submisso às potências européias e estadunidense, submissão não somente econômica, mas também cultural.

O governo de Chavez não é igual ao Evo Morales, que não se iguala ao Rafael Corrêa, que difere dos Kirchner, estes não são semelhantes ao Lula, que muito menos se compara ao recém eleito Fernando Lugo. E essa é a principal característica, nenhum dos governos age como se existisse um modelo único de sulamerica, mas todos soltam a voz e ações para firmar uma identidade própria de seu país, uma soberania que esse continente jamais possuiu, e mais: lançam diálogos entre eles para que essa soberania se estabeleça numa harmonia justa. A Colômbia não pode lançar bombas em território vizinho, o petróleo venezuelano é extraído em território venezuelano, o gás boliviano está no solo boliviano, os brasileiros em seu próprio território não podem ler a cartilha do FMI para comprar leite, e sim, os paraguaios devem reivindicar um diálogo mais amplo para sua questão energética, pois precisará se desenvolver, criar recursos para um desenvolvimento de fato.

Aos que bravejam que esses governos, através de corrupção e desejo de poder, são iguais aos seus anteriores, pouco percebem as mudanças significativas que proprocionaram e que podemos fazer mais, começando por uma avaliação crítica desses governos principalmente para extrair das entranhas desse continente a corrupção e o poder pelo poder. Podemos fazer isso através de justa eleição dos representantes, colaborar na formação de novos quadros políticos, conscientizar que a sonegação de impostos gera mais corrupção, conscientizar nossos filhos que há um bem público, que eles não devem lutar somente pelo que é seu, que é preciso ser solidário, aceitar a diferença. Talvez assim, possamos verificar que a América do Sul entrou no século XXI dando um importante primeiro passo, e que os seguintes dependerão da nossa própria ação, espero que não se perceba isso tarde demais.

14 abril 2008

Para o alto e avante!

Pois é, o Clube de Regatas Flamengo foi a Cuzco e não sofreu nenhum avaria de oxigênio e ainda saiu de lá classificado para a próxima fase da Libertadores com uma vitória espetacular de 3x0 sobre o time local Cienciano.

Nem o mais otimista dos rubro-negros poderia imaginar isso, todos estávamos cientes de que tudo que se deveria conseguir ali era um empate, mas enfim saímos de alma lavada, inclusive o Toró, autor do segundo gol, e que na última partida do Mengão fora do Maracanã foi protagonista de uma inútil violência contra um gandula uruguaio, e com justiça fora expulso.

Mais uma vez o meu time do coração é só alegria e não deixo de imaginar os pobres vascaínos, sem essas gratas felicidades futebolísticas.

28 março 2008

Chão de pedras

Correu e caiu.
O braço ficou machucado e sangrava.
Ele se levantou e ficou olhando o ferimento, não sabia o que fazer.

Continuou correndo, suor e sangue escorriam pelo braço. Nos seus pensamentos uma dúvida: por que mudaram o horário?

45 anos de idade, e tudo que ele fazia agora era correr. Uma estrada de terra, poucas árvores, chão cheio de pedras.

Ele cansou, parou e decidiu não mais correr, o sangue escorria e coagulava. Enxugou o suor do rosto com a própria camisa.

Um velho empurrando uma bicicleta vinha em sua direção bem lentamente quando viu o seu braço machucado e perguntou se ele precisava de ajuda. A resposta foi que estava tudo bem, mas que ele precisava de água. O velho disse que sua água acabou há 5 quilômetros, e que se a sede fosse grande, era melhor voltar.

Voltar?

Aquele sangue coagulado era o seu orgulho. Parou para desprezar o tempo, mas ferir seu próprio orgulho seria algo demais.

O velho observava com olhos tristes e depois de um tempo se aproximou. O homem do braço machucado se afastou para sentar numa pedra, visivelmente ele não estava bem. O velho deixou a bicicleta ao lado do homem e seguiu seu caminho.

Horas se passaram.
Um homem com sede ao lado de uma bicicleta deitada no chão de pedras.
A noite parecia longe e mais longe ficou quando seu braço voltou a sangrar.

17 março 2008

Esquina






































Eu tinha 10 anos. Quinta série, período da tarde, Manaus.

Pouco antes de chegar no colégio, na esquina da avenida Eduardo Ribeiro com a rua Saldanha Marinho, a Kombi que me levava estava parada no sinal.

Eu era o último e o único a ser entregue naquela escola, portanto ali estava eu sozinho com o motorista,que do nada virou pra mim e disse:

"Se eu tivesse a tua idade, faria tudo diferente."

O sinal abriu, fui pra aula e essa imagem nunca mais saiu da minha cabeça.

Pequeno bilhete

E o correio havia chegado, com uma carta apenas.
O carimbo indicava uma agência do Amapá.
Dentro do envelope havia apenas um pequeno bilhete:

Ontem choveu, fiquei sem o carro, mas a viagem está confirmada.

Como é bom esperar por alguém que se expressa com poucas palavras.

(Início de uma história amazônica de 1986, autor desconhecido)

10 março 2008

Enveredar

Era ela, que estava numa parada de ônibus às seis da tarde não tão longe de onde eu estava, e começou a me dizer como estava frustrada.
Eu disse: Mas você sabe muito bem que eu não posso te ajudar.

A voz dela ficou mais grave, e então fiquei sabendo que ela estava cheia de sacolas do supermercado e impaciente com a espera do ônibus, que não parava de passar, mas sempre lotado. Mencionou novamente a sua frustração.

Propus que ela me esperasse na parada de ônibus, eu chegaria em 10 minutos.
Ela disse: Não!

Desligou dizendo que o ônibus havia chegado.

Eu disse: Alô.
Ele estava na casa da mãe dele, a dez minutos da parada de ônibus onde eu estava com várias sacolas de supermercado na mão.

Procurei entender porque eu estava com aquele sentimento horrível de frustração e ele seria uma pessoa ideal pra me ajudar nisso.
Mas por que a gente sempre acha que tem que ser ajudada? Aquele telefonema me trouxe outra frustração.
Pensei: Caralho!

Ele disse: Chego aí em dez minutos.
Desliguei com a desculpa que o ônibus havia chegado, e o coletivo realmente estava ali parado, mas muito lotado, vou esperar o próximo.

Eu pensei: Por que será que ela fala tanto no celular?
É a terceira vez desde que estou aqui esperando por um ônibus vazio, quero ir sentado e pronto!
Ela parecia aflita com alguma coisa, loira tingida, bonita, com uma sandália de plataforma que lhe dava mais uns 7 cm.
Ela estava suada e isso me atraía, tomara que peguemos o mesmo ônibus!

Virtude em Cícero

E, assim como cada espécie tem alguma propriedade que a distingue essencialmente, assim o homem tem uma, mas muito mais excelente: se assim se pode falar com propriedade da nossa alma, que, sendo uma emanação da mente divina, é de ordem superior, ela não pode ser comparada, ousamos dizer, senão com a mesma divindade. Esta alma, pois, quando a cultivamos, e quando a curamos das ilusões capazes de cegá-la, alcança este alto grau de inteligência que é a razão perfeita, e à qual damos o nome de virtude. Ora, se a felicidade de cada espécie consiste no modo de perfeição que lhe é próprio, a felicidade do homem consiste na virtude, uma vez que a virtude é a sua perfeição.

(Cícero, Tusculanas Livro V, XIII)

08 março 2008

Neblina Vermelha

Minhas pernas tremiam levemente.
Tudo o que meus olhos enxergavam era um abismo preenchido de neblina vermelha.

Os pensamentos apenas imaginavam aquela viagem, o corpo em queda livre e a neblina tocando a minha pele, um frio que me faria rever um passado, onde eu conhecia todas as minhas decisões e opções, escolhas feitas para viver até chegar na última das tentações.

Não, isto não podia ser um fim.

Quis acreditar que o abismo se tornaria um imenso túnel, uma travessia. O novo e o desconhecido estariam ali, do outro lado daquela atmosfera vermelha. Tempo? Sempre fiz minhas escolhas baseadas no tempo, agora o tempo seria o meu controlador, ele me forneceria essa nova experiência, não desejava pensar nele. E um frio atravessou minhas costas...

O concreto estava liso e os meus pés estavam prontos para escorregar para o mergulho. Aquele momento estava silencioso e a neblina parecia cada vez mais densa. Vermelho sempre foi a minha cor preferida, seria por acaso? Busquei o significado do vermelho pra mim, talvez representasse tudo o que eu acredito. Listei um a um até chegar no sangue.

Minhas pernas pararam de tremer.

03 março 2008

O passo em falso de Uribe

A Colômbia vai ferver.

A ação militar colombiana na fronteira do Equador foi um erro diplomático delicadíssimo, recentemente as FARC libertaram reféns de forma unliateral e o diálogos começavam a ter bons resultado. Mas de repente, Uribe acende o fósforo e despeja suas bombas em acampamento das FARC, como se dá isso?

A resposta é difícil e sem dúvida não se pode prever quais os resultados, Chavez e Correa reagiram de forma enérgica, mas são discursos de chefes de Estado, eleitos democraticamente, e foram vozes para dizer a Uribe que seus vizinhos não estão de acordo com ações "texanas", acampamento das FARC não é Iraque nem Afeganistão. E considero remota a possibilidade de uma guerra na América do Sul como profetiza Chavez, mas o que temo é a reação das FARC, acredito que não será com discursos inflamados na TV, e sim com as suas próprias armas e sequestros.

Uribe deu um passo em falso, e tomara que não tenha como resposta mais colombianos mortos por uma violência histórica e que deve ser interrompida não com bombas caindo do céu em território equatoriano, e sim com a flexibilidade do diálogo, ação esta que seu vizinho venezuelano, cheio de bravatas, petróleo e armas, se mostrou disposto a realizar.

Lembremos mais do sonho unificador de Bolívar do que da violência de suas batalhas, para nos unirmos temos armas que não matam.

29 fevereiro 2008

Tudo Era Macedônia

I

Rosa traz para a cozinha uma bandeja com vários copos.
Um deles está quebrado.
Rosa pega esse copo quebrado, lava ele com todo o cuidado. Depois de enxugá-lo ela ensaia movimentos de esgrima como se o copo fosse a espada.

Rosa: Eu ainda te mato, sua puta!


II

Rosa tomando um sorvete em um estacionamento, ela passeia entre os carros. De repente ela avista Gabriel, vai em sua direção, dá um beijo na boca dele, ele parece bastante cansado. Eles entram no carro, Rosa na direção. Ela liga o carro e depois joga o sorvete na cara de Gabriel.


III

Rosa na cozinha segura o copo quebrado. Surgem na porta Sueli e Rafael.

Sueli: Estamos indo.

Rosa esconde o copo atrás de si. Sueli se aproxima para beijar Rosa. Gabriel entra na cozinha.


IV

Rosa e Sueli estão na parada de ônibus, que está bem lotada.

Sueli: Desde quando você também pega esse ônibus?
Rosa: Desde a semana passada, por quê?
Sueli: É que talvez ele não seja o melhor para você.
Rosa: Você tem alguma outra sugestão?
Sueli: Tenho, mas aí você vai ter que ir para outra parada.


V

Rosa no banheiro lavando sua mão, que está toda cortada. Jorra muito sangue. Gabriel está ao seu lado.

Minutos antes na cozinha:
Sueli abraça Rosa. Escuta-se o som de vidro quebrando. Rosa solta um forte grito de dor.


VI

Rosa está numa parada de ônibus sozinha.


VII

Rafael está varrendo o chão da cozinha e catando os pedaços de vidro do chão. Sueli está sozinha na sala. De repente Sueli começa a rir. Rafael surge e pergunta do que ela ri. Sueli não consegue responder, pois o riso é incontrolável.


VIII

Rosa fecha a torneira, Gabriel começa a fazer um curativo.

Sueli não consegue parar de rir.
Rosa aparece na sala com metade da mão enfaixada, ainda sangra um pouco.
Rafael e Gabriel ficam constrangidos com a situação: Sueli às gargalhadas e Rosa ali parada, apenas observando e com sangue escorrendo pelo curativo.


IX

Rosa e Gabriel deitados na cama de um hotel barato. Ele está deitado de barriga pra cima. Ela está de bruços e folheando uma agenda.
Rosa folhea os mapas no final da agenda.

Gabriel: Em que país você está?
Rosa: Na Macedônia.
Gabriel: Você sabia que um dia tudo foi Macedônia?
Rosa: Tudo o quê?
Gabriel: Tudo ué, tudo isso que você tá olhando aí.

Rosa rasga a página que tem o mapa da Macedônia. Gabriel observa espantado.
Rosa se levanta e entra no banheiro.


X

Gabriel está na porta do banheiro de sua casa.
Do outro lado da porta escuta-se o choro contido de Rosa.
Pingos de sangue estão espalhados pelo chão.


XI

No quarto de hotel Rosa está junto à janela olhando a rua pelas frestas da veneziana. Gabriel dorme de barriga pra cima.
No cesto do banheiro está o mapa arrancado por Rosa.
Ao lado da Macedônia está escrito a lápis:

“Sueli”


XII

Sueli e Rosa estão na parada de ônibus, que está lotada.
Rosa está com a mão enfaixada.

25 fevereiro 2008

Águas no Maracanã

O segundo tempo da final da Taça Guanabara (primeiro turno do campeonato carioca) fez chover água do céu e o Fogão, que esquentou o gramado e a cabeça do Mengão no primeiro tempo, se apagou nas próprias lágrimas.

Mengão vitorioso e Botafogo chora, isso mesmo, de novo! Chora jogador, técnico, presidente e todos com a mesma história: passaram a mão no glorioso.

Como rubro-negro de coração, estou longe de chorar, só alegria, ainda mais ver o que o Joel (técnico do Flamengo) fez, as alterações no segundo tempo simplesmente acuaram o Botafogo, que então vencia por 1x0. Cuca (técnico do Botafogo) simplesmente não acreditou no que viu e fez uma alteração aos 12 minutos, porque sentiu que a coisa ir ferver para o fogão.

15 minutos/segundo tempo. Penalti para o flamengo. Pensei: Otimo, mas vai ser um saco ouvir botafoguense reclamando da arbitragem, mais uma vez!

O zaguerio do Botafogo praticamente arrancou a camisa do zagueiro flamenguista Fábio Luciano, e o pior, na cara do juiz, que ao ver um jogador quase sem camisa e arremessado ao chão não teve dúvida, era dentro da área e era penalti!

Ibson, o craque, bate com perfeição e o Mengão empata!

Daí em diante teve expulsões, brigas, chuva, emoção atrás de emoção. E eu ali na frente da tela de um computador ouvindo o jogo pela Rádio Globo, nenhuma TV transmitiu em São Paulo, absurdo! Sem contar que o pay per view custa 60,00!!! Mas enfim, meu coração bate por ti mengão, vamos ouvir na rádio!

E pra completar a emoção, Joel, vou me permitir a liberdade e o exagero de chamá-lo de gênio Joel, colocou mais um atacante em campo: Diego Tardelli. Não deu outra, gol de Tardelli nos acréscimos! Mengão 2x1, de virada.

Flamengo campeão da Taça Guanabara e está na final do campeonato.

Jogo emocionante, nada daquelas coisas patéticas dos campeonatos europeus, onde tudo é muito certinho e vemos apenas milionários exercitando suas habilidades. Acredito no futebol da raça, do choro, da emoção, dos cartões vermelhos, dos erros do juiz, assim a gente sente o coração mais de perto e tem a certeza de estar vivo!

24 fevereiro 2008

Seja bem vindo ao encontro das águas



O encontro das águas é uma das principais atrações turísticas do Amazonas, onde o rio Negro, de águas escuras, encontra o rio Solimões, de águas barrentas.

O rio Solimões é nome do rio Amazonas desde que entra no estado do Amazonas, vindo do Peru, até o encontro das águas, em Manaus, a partir desse ponto até o oceano Atlântico ele passa a ser denominado rio Amazonas.

Para saber mais:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Encontro_das_águas
http://pt.wikipedia.org/wiki/Rio_Solimões
http://pt.wikipedia.org/wiki/Rio_amazonas

23 fevereiro 2008

Cícero - envelhecer

Os frutos da velhice, tenho dito e repetido, são todas as lembranças do que anteriormente se adquiriu. Ora, tudo o que é conforme à natureza deve se considerar como bom. Que há de mais natural para um velho que a perspectiva de morrer? Quando a morte golpeia a juventude, a natureza resiste e se rebela. Assim como a morte de um adolescente me faz pensar numa chama viva apagada sob um jato d'água, a de um velho se assemelha a um fogo que suavemente se extingue. Os frutos verdes devem ser arrancados à força da árvore que os carrega; quando estão maduros, ao contrário, eles caem naturalmente. Do mesmo modo, a vida é arrancada à força aos adolescentes, enquanto deixa aos poucos os velhos quando chega sua hora. Consinto de tão boa vontade tudo isso que, quanto mais me aproximo da morte, parece que vou me aproximando da terra como quem chega ao porto após uma longa travessia.

(Cícero, "Saber Envelhecer")

21 fevereiro 2008

Questionabilidade

Ela preparava o recheio.
Na janela um pequeno vaso a observava.
Sua dúvida estava não mais no modo de preparo, mas se a ocasião era realmente a mais apropriada para mostrar a sua grande invenção culinária.
O tormento da incerteza lhe consumia e num repente ela parou tudo. Ela não podia se dar ao luxo de um intervalo, os minutos consumiam o desgaste no relógio de parede. Mas era preciso pensar!

Após contar e nomear todos os presentes à mesa na hora do jantar, ela se deu conta de uma coisa: uma pessoa em especial merecia provar aquela nova receita. O motivo? Esperemos um pouco.

Volta à cozinha, recomeça o trabalho com dedicação espartana.

Pronto, está pronto. 20h.

Um banho bem tomado, perfume no corpo, roupas leves.

Dia seguinte.
Sentada no sofá vermelho de sua sala, tudo que ela investiga em sua memória é onde havia errado. Todos os ingredientes estavam certos, o modo de preparo poderia até ser diferente, mas com toda a sua experiência era impossível errar, mas ela errou.

Foram somente duas vozes que citaram a estranheza, a primeira ficou incomodada com a pimenta. Pimenta? Sim, isso mesmo, a pimenta. Mas enfim, era um prato de inspiração indiana...
A segunda pessoa disse que... Ah, esta segunda pesssoa era quem realmente deveria provar o novo prato, o motivo? Ela com certeza não iria gostar, qualquer que fosse o cardápio. Elas se odiavam, e tudo por causa de um cabelereiro. Raios! Mas por que ela estava naquele jantar? Sabe aquelas coisas de grandes amigos em comum? Pois é...
Voltando, o comentário foi que tudo estava aguado.
Se havia sinceridade nesse comentário? Sem dúvida! Ali sentada em seu sofá vermelho ela lembrava o olhar de sua inimiga na noite anterior, pura sinceridade.
Esse foi o maior tormento, ela queria ouvir uma única reclamação, e sentir falsidade, mas aconteceu o contrário. Além de uma pessoa neutra ter reclamado da pimenta, a sincera crítica de uma rival a fez desmoronar.

E agora? Pimenta e água, como isso estava em exagero?

Tudo que ela podia crer era que a TPM a afetava com toda a sua força naquele mês, perdera a medida das coisas.

(e foi tudo o que ela disse ao caixa do banco)

20 fevereiro 2008

Coletor e cobrador

Av. Paulista, manhã.
O ônibus pára no sinal. Eu estou sentado dentro desse ônibus, dois bancos para trás do cobrador.
Ao lado do ônibus está um caminhão de lixo.
O cobrador lê um jornal (que parece ser um daqueles distribuídos no metrô).
O coletor de lixo, pendurado na traseira do caminhão ao lado, se aproxima da janela do ônibus e fala ao cobrador:
- Que emprego bom esse hein!
O cobrador responde algo meio desconcertado. O coletor continua:
- Sai de casa e fala pra mulher que vai trabalhar e passa o dia passeando de ônibus.
O coletor solta uma risada. Um outro coletor, pele bem clara, olhos pequenos e pendurado na outra barra de ferro da traseira do caminhão, também sorri.
O cobrador ri e novamente responde algo meio desconcertado.
O coletor então diz que sabe que o trabalho do cobrador parece fácil, mas tem hora que a coisa aperta, fica difícil, com muita tensão. Em seguida forma na sua mão um revólver com os dedos. Na seuqencia ele completa:
- Deus é maior!
O cobrador responde que o trabalho do coletor também parece difícil. O coletor confirma dizendo que é bom por passear também, mas o cheiro, andar pendurado, risco de tontura na cabeça, e muitas outras coisas fazem o serviço mais duro, mas "Deus é maior".
O sinal abre.
Os dois trabalhadores se despedem, risos em seus rostos.
O ônibus vai mais rápido que o caminhão de lixo.
Penso: e o motrista do caminhão, como será?
Espero passar pela janela e quando vejo, lá está ele, um homem de meia idade manipulando um jornal (que parece ser um daqueles distribuídos no metrô) e o voltante de seu caminhão.

Futebol pela manhã

Futebol.
O brasileiro Mancini fez gol pela Roma na vitória contra o Real Madrid pela liga dos campeões.
Vi essa notícia em dois noticiários pela manhã, ambas narradas com um entiusiasmo pelo sucesso do futebol brasileiro.
Argh.

There will be blood

There will be blood é there will be blood.

A tradução não foi feliz para o recente filme de Paul Thomas Anderson, a expressão 'Sangue Negro' é até compreensível no filme, mas o título original é o tom do filme.

Filmaço, ele exploode na tela, um verdadeiro filme de cinema em tempos que muitos consideram que ver em casa ou no computador não faz a menor diferença. Os enquadramentos são cuidadosos para expor uma narrativa linear mas perpendicularizada com os elementos que compõem a vida ebuliçada do personagem interpretado por Daniel Day Lewis. O desenho de som do filme constrói um envolvimento perturbador, uma concepção rara de ser ver.

No início do século XXI trazer um enredo que se passa no início do século XX e sobre o petróleo, é por si só uma reflexão importante para pensarmos quais valores construíram o século passado e que herdamos numa selvageria individualista.