30 dezembro 2013

Rita

O ônibus parou em frente a uma drogaria, ela desceu junto com outras mulheres, todas pelo menos vinte anos mais velhas que ela. Eram dez pra sete da manhã, e a medida que as senhoras se espalhavam pelas ruas ao seu redor, Rita pensou consigo mesma que todas poderiam ser domésticas nos apartamentos bacanas da região e lembrou de sua mãe.

Aquele bairro de São Paulo também lhe trazia outras recordações, havia namorado um cara bem mais velho que ela e que trabalhava numa videolocadora na rua de trás daquela drogaria; na época, com menos de 18, sempre desconfiava que era ali que o cara comprava as camisinhas de suas transas, e por conta disso nunca entrara ali pois tinha certeza que seria reconhecida pelos funcionários que logicamente estariam a par de sua vida sexual. Rita riu.

Tudo era passado. O bairro se transformou assim como a sua própria vida.

Rita entrou na drogaria e passeou pelo setor de escovas de dentes. Ficou parada em frente das gôndolas, pegou na mão um ou dois modelos de escova porém não escolheu nenhum. Em seguida fez a mesma coisa com os shampoos. Entre escovas de dentes e shampoos ocupou quase uma hora de seu tempo. Rita chegou a pensar se aquilo chamara a atenção dos funcionários e da segurança, mas dane-se, ela tinha certeza de que ela mesma não era uma ameaça e isso bastava.

Ao sair e caminhar pelas ruas do bairro Rita sentiu vontade de chorar, havia saído de casa após uma longa noite de insônia e considerando que aquilo seria um passeio, mas no fundo buscava algo de seu passado, mesmo que fosse uma lembrança simples, de um namorado sem importância. E foi aí que encontrou a chave para o vazio que lhe fazia chorar, dera importância a algo sem importância, fugia de suas aflições verdadeiras.

Faltava pouco para as nove, era preciso ir trabalhar, resolver problemas cotidianos.

Já dentro do ônibus postou uma foto da drogaria no facebook e escreveu: isso me lembra boas trepadas e nada mais.

26 dezembro 2013

46 anos

46 anos.
Ela olha seu corpo nu no espelho de seu quarto. Não concorda com o que vê, mas sente libido. Tem vontade de desejo e perversão.
É seu aniversário, daqui a pouco uma comemoração divertida com as amigas, sem perversão alguma, mas quem sabe se no bar surgem olhos libidinosos de um homem que transformem algo em mais coisas... São amigas que ficam, que a compreendem. Sem roupa alguma no corpo, ela não sabe avaliar o peso daquelas amizades. O importante é que neste momento elas lhe estendem um ouvido, amigas que dão risadas das mesmas piadas.
Escolhe a calcinha mais adequada e se veste por inteira. Ela não quer chorar naquela noite, a vida inteira chorou em seus aniversários, ops, a vida inteira não, mas com certeza desde os seus 20 anos.

26 anos.
Flávia sempre achou estranho fazer aniversário no mesmo dia que sua mãe. Há três anos que não se falam, Flávia mudou de cidade e busca sua própria autonomia. Ela acha que a mãe envelheceu rápido demais.
É 26 de dezembro, uma data vazia como a considera Flávia, nem natal nem ano novo, mas no fundo, que importancia tem tudo isso? Ao seu redor ninguém sabe do seu aniversário, na verdade ninguém liga a mínima para o que ela pode significar nesse mundo.
Flávia diz pra si mesmo que está feliz naquele dia. Espera que o cartão enviado pelo correio chegue o quanto antes na casa de sua mãe.

O ano acaba e um novo começo virá... Flávia e sua mãe têm certeza disso, apesar de não esperarem somente felicidades.

19 dezembro 2013

Muito além de um chester.

Boa parte da população clama por melhor educação no Brasil, a educação é vista como a solução de todos os nossos males sociais, econômicos e históricos. Concordo, porém não entrarei aqui nas linhas mais duras e delicadas dessa questão, que considero que vai além de ser um discurso quase uníssono, o objetivo aqui é repassar a indignação de uma professora do estado do Amazonas, que com certeza lança mais lenha na fogueira sobre o debate de qual 'melhor educação' estamos querendo.

M. adora dar aulas de química orgânica aos seus alunos

Fim de ano.

2013 chega ao fim e a secretaria de educação do estado do Amazonas, conhecida como Seduc, presenteia todos os professores com chesters para que os educadores possam desfrutá-los nas ceias e confraternizações das 'boas festas'. Porém, a distribuição é feita por escola e não por uma lista geral de todos os professores da rede, assim alguns educadores aparecem em mais de uma lista do benefício, uma vez que dão aulas em diversas escolas.

M., professora há quase quarenta anos, recebe dois chesters, não questiona a duplicidade do presente natalino, pois se seu nome estava nas duas listas, obviamente ela acreditou que isso era uma determinação da própria Seduc. Porém a diretora de uma das escolas em que M. leciona, resolveu fazer uma investigação, por dias telefonou para outros professores amigos de M. assim como para a diretora da outra escola, sorrateiramente buscou saber se M. havia recebido duas unidades do chester da Seduc.

Numa manhã, na sala dos professores, a diretora detetive se aproximou de M. e lhe deu uma lição de moral na frente de outros docentes, informando que não era correto uma professora ficar com dois chesters, não foi uma conversa, foi uma bronca humilhante. M. devolveu os dois chesters no dia seguinte às escolas, a indignação pela humilhação e despreparo da diretora da escola em abordá-la foi realmente triste.

M. tentou explicar que não agiu de má fé, não sabia da limitação de apenas um chester por professor, descobriu casos semelhantes de professores que também passaram pela mesma situação e foram levados a devolver. Ela cita ainda que alguns de seus colegas que estavam presentes na bronca que ela levou, também haviam recebido duas unidades, porém sem a investigação da diretora.

M. ficou muito triste. O chester não lhe faz a menor falta, o que lhe faz falta é um reconhecimento adequado de sua profissão. Quase todos que gritam por uma melhor educação, conhecem as condições precárias de trabalho dos professores das redes públicas de ensino. E hoje a dificuldade não é somente material.

M. relata o que vê nos celulares de seus alunos com menos de 16 anos, brigas, sexo, maconha, videos e fotos com traficantes. M. comenta sobre a dificuldade em fazer um aluno com menos de 16 anos valorizar o ensino que está lhe sendo oferecido. M. fala de seu esforço diário em motivar alunos com problemas diversos, os quais sempre esbarrados na esfera econômica e social, resultado de todas as nossas desigualdades e injustiças sociais.

Mais triste ainda é verificar a insensibilidade de nossos gestores. A propaganda de que a gestão pública é legal com a entrega de chester contrasta com a ineficiência de organização interna, da inabilidade de uma diretora de escola em contornar o erro institucional. Tudo que os alunos de M. precisam superar diariamente por conta de um ensino precário se estabelece na insensibilidade da gestão, da diretora, da Educação (sim, com E maiúsculo).

Paremos de ser hipócritas e repetir discursos comuns, busquemos uma sociedade mais fraterna, que a educação não passe por excelência de ensino somente, mas por humanismo nas relações. Paremos de achar que Coréia do Sul e meia dúzia de países que espoliaram o mundo são referências para a nossa educação, busquemos as referencias no nosso próprio estômago faminto, pois assim compreenderemos melhor as injustiças sociais e impulsionaremos a humanização para além do individualismo e do nefasto caráter meritório da cultura capitalista decadente em nossas peles.

“É porque podemos transformar o mundo, que estamos com ele e com outros. Não teríamos ultrapassado o nível de pura adaptação ao mundo se não tivéssemos alcançado a possibilidade de, pensando a própria adaptação, nos servir dela para programar a transformação.” (Paulo Freire)

18 dezembro 2013

Navegantes - Programa 4

Quando: 21 de dezembro de 2013
Onde: Editora FiloCzar - Rua Durval Guerra de Azevedo, 511 Pq. Sto. Antônio (São Paulo/SP)
Horário: 19h
Para saber mais sobre o Navegantes clique aqui.

"A Distração de Ivan', de Cavi Borges e Gustavo Melo

"SÉCULO"
MG / 11 minutos / 2011
Dir: Marcos Pimentel
Sinopse: Conosco, o amor. Entre nós, o tempo.

"A DISTRAÇÃO DE IVAN"
RJ / 15 minutos / 2009
Dir: Cavi Borges, Gustavo Melo
Sinopse: Ivan é um menino de 11 anos. Ele vive com a avó no subúrbio do Rio de Janeiro. Em meio ao seu cotidiano de brincadeiras e brigas com os amigos, ele vai amadurecer.

"A CASA DOS MORTOS"
DF /  24 minutos / 2009
Dir: Debora Diniz
Sinopse: Jaime, Antônio e Almerindo são homens anônimos, considerados perigosos para a vida social, cujo castigo será a tragédia do suicídio, o ciclo interminável de internações, ou a sobrevivência em prisão perpétua nas casas dos mortos.

02 dezembro 2013

Torre entre as pedras

Os pés descalços caminham pelo piso gelado da cozinha, o esmalte de suas unhas está corroído e ela sabe que sua preocupação com a própria vaidade tem sido quase nula nas últimas semanas, a exceção é a sua boca, que pode contar com um batom quase sempre.

Estranhamente ela encontra quatro pedras sobre a mesa, são pequenas, escuras e leves. Como é que foram parar ali? Pergunta a si mesma. Decide levá-las para a sala, havia pensado em jogá-las fora, mas acredita que podem combinar com a torre eiffel que uma amiga lhe trouxe, apesar dela detestar esse tipo de lembrancinhas de viagem.

A pequena torre eiffel de plástico fica soterrada pelas pedrinhas, como naqueles filmes apocalípticos. Ela ri, gosta da sua invenção, pois enxerga um sentido naquela composição de objetos. Enfim, é o sentido que a sua vida está tomando, alterar as ordens das coisas, desestagnar-se.

Mas será que ela está seguindo à risca esse rumo? Ela reconhece que coisas muito mais importantes que a decoração de sua casa precisam ser reordenadas. Não sentir a obrigação de ter um namorado é uma delas, o amor precisa ser repensado, apesar de que muitos acreditam que ele precisa ser redefinido. Quantos rês! Ao sorrir para a torre entre as pedras, ela conclui que não deseja se redefinir, apenas tirar algumas coisas da ordem.

Jogados ao lado do sofá estão papéis que precisam ser lidos para que assuntos avancem no escritório onde trabalha. Ela começa a rasgar folha por folha como se aquilo fosse terapêutico. De frente para o amontoado de papéis rasgados, ela começa a chorar. Acredita que mergulhou numa loucura, sente medo. Liga para uma amiga. "Por que você não faz uma viagem?", pergunta a amiga no esforço de aliviar a situação e recebe como resposta um 'como você é tola!'

Desprezando seu medo, ela quer que sua loucura seja mais profunda e procura mais pedras pela casa.

28 novembro 2013

Amplificação

O som que surgiu pelo quarto amplificava a sensação da ventania que entrava pela janela. Havia uma paz no ambiente;e as recordações da voz dela me levavam a crer que as coisas seguirão bem. Não é fácil descrever sensações.

A distância nos guia por certas curvas, o qe nos levar a crer que seguimos por um labirinto. Assim o vento ficou mais forte. Gosto de imaginá-la em agitação, ela é e se faz ser ela mesma na espontaneidade de sua agitação.

Sonhos de seu sono quero ouvir.

24 novembro 2013

Contra e com raul

As semanas passavam tão depressa, que ela dizia que o paraíso podia estar próximo, mas possuía espinhos.

O seu lugar estava definido e tudo que ela desejava era destruir tudo e, obviamente, recomeçar as coisas.

Barreta

Alice não me escreva aquela carta de amor.

Assim, com uma música perdida naqueles anos 80, que ele encontra um destino perdido na cidade que sabe exatamente onde os mais errantes se perdem.

Estende-se por um porão falseado por uma idade média mais game ainda.

Alguma roupas em volta não fazem sentido, outras são outras.

"Precisamos todos rejuvenescer"

E as canções perdidas no tempo continuam.

15 novembro 2013

Olhos atentos

Dormi pouco, mas não por conta de alguma aflição, havia sobriedade no espírito. Acordei bem. O dia precisava ser produtivo.

Foi todo um processo de concentração, estive dedicado nas tarefas, e consegui ainda reforçar algumas pendências. Ela deu notícias, conversamos por muito tempo e foi incentivador.

A principal dobra de nossas dúvidas acerca de nossas possibilidades está na pacificação de nossos medos, e olhar atentamente por onde eles operam.

[diário de uma saudade [3]]

14 novembro 2013

Exercício

Observar de longe a expressividade da personalidade de uma pessoa é curioso, parece que é um exercício de buscar de todas as formas compreender o outro. Ao sentirmos a distância incomodando, acredito que esse exercício seja inválido. Hoje apenas quis tê-la nos pensamentos.

Algumas conversas foram elucidativas sobre as nossas formas de lidar com o mundo. Os meus interlocutores apontavam para algo que está se perdendo no convívio em sociedade. Pensei se isso era apocalíptico. Tentar compreender as coisas entre causa e consequência pode nos transtornar mais ainda. Foi bom ouvi-los para entender mais sobre as nossas feridas e cicatrizes na missão de conviver com os nossos semelhantes.

No início da noite, o exercício físico e espiritual me forneceu mais elementos para a autocompreensão. A noite entrou com o coração em amor por ela. Assisti a um filme em casa e a mente harmonizou-se. Ela não deu noticias. Sim, isso é aflitivo. Harmonia, esteja comigo.

[diário de uma saudade [2]]

13 novembro 2013

Por meio de uma linha telefônica

Roupas de um lado, roupas dentro da mala, roupas em suas mãos. Ela ficou ali na ordenação de suas coisas e nos despedimos. Considerei uma despedida fria, mas sim, havia amor.

Fui ao encontro de um amigo, depois caminhei só, quis ver pessoas nas calçadas naquela noite.

Antes da partida e às portas do embarque dela, sua voz veio me dizer palavras fortes cuja intensidade reforçou o amor. Por meio daquela linha telefônica uma luz se fez perante meu inconsciente, sobre o qual estou vigilante há uns meses. A errância na qual me afogo aparentemente não é sombria, pode sim ser aproveitada na medida certa, mas há um leme no qual preciso segurar firme e naquela noite ele poderia se desgovernar.

Ao desligar, um carinho forte estava em meu espírito e todas as palavras dela afetuosamente absorvidas em meu ser. As saudades começaram a apertar, obviamente motivadas por amor.

[diário de uma saudade [1]]

31 outubro 2013

As vizinhas abandonadas

De que modo poderíamos pensar naquela separação? De um lado, desejos, impulsos e vitalidade; do outro, simplicidade, humildade e busca interior. Mas haviam porões desconhecidos, invisíveis como cada uma caracterizava os seus cômodos escondidos.

Como é pretensiosa a humanidade quando ela mesma julga que existem coisas inseparáveis, o próprio tempo abandona e corrói todas as relações.

Se a janela lhe permitia observar o mundo e alimentar os desejos, ela acreditava também que a porta seria o que lhe levaria para o desconhecido. Mas tudo que podia ver era um entra e sai, histórias que reverberavam ao seu redor, algumas mais interessantes que outras.


Se a porta não lhe fornecia a liberdade desejada, corria para o seu porão, onde vivia seu mundo de inquietações.

A infância era um passado assim como as incertezas da adolescência, restava-lhe esse vigor dos vinte anos, permitir-se ao perigo, a tudo que pudesse lhe negligenciar a responsabilidade. No porão nutria sua verdadeira essência. Perversões do corpo e da alma.

Até que um dia ficou apavorada com a repugnância que sentia de todos que conhecia, buscou aliviar iluminando o escuro do porão e dizendo a si mesma que aquilo era mera vontade de conhecer outras pessoas e lugares. Porém a luz que acendeu revelou algo a mais.

Num canto havia uma porta. Seria essa a verdadeira porta para a sua vida?

Desbravadora, avançou, abriu a porta e de imediato não entendeu exatamente o que vira. Havia encontrado um outro porão, muito semelhante e apenas aparentemente mais arrumado que o seu. Resolveu fuçar. Mexeu nos objetos, leu cartas empoeiradas, viu fotos gastas, encantou-se. A porta fechou com toda a força atrás de si. Um frio percorreu seu corpo, estava trancada num porão alheio.

Horas se passaram e ela adormeceu.

Acordou com uma mão feminina empurrando a sua testa. Ela levantou num pulo e percebeu o rosto familiar. As duas começaram a rir. Por um tempo ficaram conversando sobre seus escondidos templos, a diferença de idades forçou um apelido à dona desse porão: Caçula.

A verdadeira essência da Caçula buscava caminhos para o seu interior, ela havia perdido a fé, tanto em Deus quanto nela mesma. No seu porão ela poderia não ser forçada a acreditar em algo, experimentava a si mesma.

Conversavam longamente. A discussão tomava rumos diversos, pra começar, o que elas poderiam compreender como opressão. A porta para voltar ao outro porão nunca mais se abrira e a sua dona começava a já não se reconhecer mais, percebia que vivia em função da outra.

Elas haviam perdido a noção do tempo de suas vidas e sabiam que precisavam tomar uma decisão. Sim, iriam se separar, um porão não poderia lhes unir para sempre.

Livres e errantes, foram viver longe daquelas casas abandonadas.

29 outubro 2013

Entre ratos e famintos

Com uma colher aquele rapaz de uns vinte e poucos anos, negro, de aspecto encardido e usando roupas surradas, devorava uma galinha ensopada num pequeno prato fundo. Chegamos e nos sentamos na mesa ao lado. Gosto daquele bar, pequeno, proprietário atencioso, poucas mesas na calçada, cerveja barata e uma vista não bonita para um trecho Bela Vista, mas agradável e que com a calma da rua transmite pra mim um boa tranquilidade no espírito.

O dono, um nordestino do Piauí, já sabe a minha preferência de cerveja e trouxe uma bem gelada, logo em seguida, ele foi até a mesa do rapaz e recolheu o prato sem sobras. O rapaz agradeceu e desceu a rua para seguir seu destino que pelo menos por enquanto não lhe maltratava com a fome. Reconhecemos como um gesto nobre e humano por parte do dono do bar aliviar a fome alheia e conversamos a respeito durante a primeira cerveja.

Ela me disse que possuía dificuldades em lidar com pessoas em situações de rua, não consegue uma aproximação tranquila e busca trabalhar espiritualmente para superar essa questão. Conversamos sobre culpa, medos e como nos relacionamos com os problemas sociais.

Durante a terceira e última cerveja, meus olhos se fixaram num canto da sarjeta junto à calçada do bar. Ela me observou e depois virou o rosto na mesma direção. Um rato de esgoto correra para dentro da boca de lobo. Ela me olhou, nitidamente incomodada com o que vira. Por outro lado, ela sabia que ali, independentemente de famintos e ratos, era um local por mim adotado, onde muitas vezes solitariamente sentei apenas para deixar os pensamentos fluírem, ouvir conversas de desconhecidos, meditar.

Fiquei um tanto constrangido, obviamente, mas sem culpa, pois nessa noite tudo que experimentamos nesse bar, principalmente as nossas conversas, me fez ter a certeza de o quanto é bom tê-la por perto.

11 setembro 2013

Navegantes - Programa 3

"Ikó-Eté"


 
Quando: 21 de setembro de 2013
Onde: Editora FiloCzar - Rua Durval Guerra de Azevedo, 511 Pq. Sto. Antônio
Horário: 17h
Para saber mais sobre o Navegantes clique aqui.




"COHAB"
SP / 9 minutos / 2013
Dir: Lincoln Péricles
Sinopse: Meu prédio: o horizonte, as crianças, os amigos, os blocos. Um dia sóbrio no bairro do Capão Redondo, periferia de São Paulo.

"O PACOTE"
SP / 18 minutos / 2013
Dir: Rafael Aidar
Sinopse: Em uma nova escola, os jovens Leandro e Jefferson formam uma ligação instantânea e logo percebem que não se trata de uma amizade comum. Mas Jeff tem algo a dizer. Se eles querem ficar juntos, Leandro deverá lidar com algo irreversível. Algo que faz parte do pacote.

"IKÓ-ETÉ"
PB / 9 minutos / 2012
Dir: Torquato Joel
Sinopse: O que acontece quando surta um remanescente dos potiguaras, um dos povos mais bravios e resistentes da costa brasileira durante a primeira ocupação, no período colonial.

"CÂMARA ESCURA"
PE / 21 minutos / 2012
Dir: Marcelo Pedroso
Sinopse: Quando as imagens dos objetos iluminados penetram num compartimento escuro através de um pequeno orifício e se recebem sobre um papel branco situado a uma certa distância desse orifício, veem-se no papel os objetos invertidos com suas formas e cores próprias.

29 julho 2013

Onde estará Vincent Vega?


"Eu não consigo ver o suor em seus ombros, eles apenas me desafiam"

Foi isso que ele falou no ouvido dela enquanto caminhavam pelas ruas planas da zona leste numa noite quente de inverno. Ela não respondeu nada, seu silêncio era a sua arma e no fundo de sua alma a impaciência lhe formigava o fígado.

Desde que deixaram o metrô para trás e buscavam o mais rápido possível chegar ao apartamento de uma tal Renata, ela não compreendia mais o sentido daquela companhia, o suor ensopando sua camiseta lisa e o cara veio falar dos seus ombros, que ela os considera muito feios. Genética, herdou da mãe, da vó e de muita gente.

Uma camiseta causou a aproximação. Que raiva hoje ela sente desse seu passado de camisetas que precisavam significar alguma coisa. Num boteco de cerveja barata e pessoas interessantes ele perguntou a ela: "silk and the banshees, é um trocadilho bem infame na sua camiseta, não é?". Hoje ela não entende porque isso a conquistou.

Renata era o limite. Com o suor escorrendo pela nuca ela se recusaria a entrar naquela reunião idiota de amigos e diria a ele que acabou. Chega!

O fígado pedia para ser massacrado, o alívio nas suas entranhas exigia beber até a noite nunca acabar. Percorreu seus guetos e suou dançando, suou conversando com amigos e amigas, amanheceu suada. Enfim, o dia seguinte.

Ficou nua em frente ao espelho, cambaleando e com o mundo girando ao seu redor. Tentou, tentou e tentou ver algum charme em seus ombros ossudos. Bêbada, jamais discerniria alguma coisa, apenas sabia que seus pés eram fantásticos e desejou uma massagem.

Sonhou com Mia Wallace.

20 julho 2013

Compreender o que é a Militancia no Século XXI



O companheiro Mário novamente nos lançou uma colaboração importante para reflexão nesses dias que vivemos, o seu texto “Quemtem medo do novo” traz elementos que podem fincar certas bases para aprimorarmos o pensamento. Iniciarei com um desabafo que pode me custar muitas críticas, mas prefiro, nesse momento, ser bem sincero.

Não sou entusiasta das manifestações. Também não condeno a ida às ruas. Melhor transporte público, melhor saúde, melhor educação, menos privatizações, também é ÓBVIO que sou a favor dessas reinvindicações. E me diga, quem não é? Ah, os governantes corruptos, os capitalistas de direita, os grandes grupos de comunicação, sim, sim e sim. Pois bem, vivemos mesmo uma luta ideologicamente dialética?

Falta-me entusiasmo por uma simples falta de identificação, apesar de que OBVIAMENTE me identifico com as reinvindicações. O motivo também não é o “medo do novo”, quem me conhece mais de perto sabe o quanto sou muito ligado à juventude, principalmente na área cultural. Inclusive, enquanto muitos criticam as novas gerações, eu apoio e as compreendo, enxergo que a tecnologia e o seu pensamento menos estanque em conceitos predefinidos leva essa juventude a ser mais incisiva em suas colocações.

A falta de identificação vem porque acredito que estamos num processo lento, repito: LENTO de transformações profundas nesse país. Lutei muito para que 2002 fosse um ano realmente de virada histórica para o Brasil, e foi! E minha luta não estava baseada em ideais perfeitos, cheios de éticas inabaláveis ou romanticamente revolucionários, estava baseada no sentimento de que precisávamos começar a transformação. Já disse diversas vezes: a minha admiração pelo Lula não vem porque ele salvou esse país, ele apenas começou o processo, nada está salvo e precisamos compreender que continuamos sendo um país pobre!

Além de pobre temos dois canceres: corrupção e cultural neoliberal. Ambos estão fincados culturalmente, ou melhor, ideologicamente, nos cidadãos. Fala-se em corrupção dos governantes, mas no seio da população todos nós alimentamos o caixa dois de redes capitalistas, de traficantes de maconha (sou a favor da legalização), de mafiosos da pirataria e buscamos sonegar impostos quando podemos. A cultura neoliberal do estado mínimo está no constante discurso de que o Estado e a política atrapalham o cotidiano, aí surgem os discursos que não tem investimento pra educação, saúde, bla bla bla.

Além dos cânceres corrupção e cultura neoliberal, precisamos frear o monstro consumista, a cultura do ter e somente ter. A economia brasileira se fortaleceu nos últimos dez anos e nos levou a comprar mais e alargar os mercados internacionais de atuação do país, porém culturalmente pouco avançamos, e os conceitos de cidadania, de bens públicos e de coletividade se perdem cada vez mais. Se o capitalismo está em crise, o seu legado tem sido o individualismo cada vez mais agressivo.

Como muitos compreendem a justiça nos dias de hoje? Compreendem que se eu tenho algo, ninguém tem o direito de tirar de mim. Eu, particularmente, compreendo justiça como ninguém ter a necessidade de ter que tirar algo de alguém. É óbvio que jamais teremos uma sociedade 100% livre de assaltos ou roubos, mas a justiça precisa estar direcionada às causas das desigualdades sociais, que hoje é gerada pela cultura consumista.

Daí vem a minha única divergência ao texto do companheiro Mário, não considero que “uma consciência nova, anticapitalista” está se formando. Enxergo exatamente o contrário, é justamente a consciência capitalista do consumo, do real conhecimento das relações produto-consumidor, que está gerando insatisfação generalizada. Os cidadãos desejam consumir com qualidade. Não está em debate como construir um Estado forte e capaz de dar conta do nosso crescimento e demandas políticas e sociais, está em debate apenas a crítica, a insatisfação consumista. E pior: como se as nossas carências não fossem históricas.

Sugiro a leitura do seguinte artigo escrito por Wolfgang Streeck publicado na edição 79 da revista Piauí: clique aqui.

Volto a dar as mãos ao Mário na sua reflexão do papel de um partido comunista. Sim, um verdadeiro partido comunista deve ser o responsável em fertilizar o NOVO. Esse NOVO não está integralmente nas manifestações recentes, está apenas em parte, e precisamos compreender melhor o que é o NOVO no momento em que o país se encontra, no momento em que um processo de transformações está em curso, longe de estar consolidado e que está sendo duramente atacado e minado pelos mais diversos setores da sociedade, incluindo aí não as manifestações em si, mas suas nocivas reverberações.

Ao escrever a frase “parece que sua experiência [do PC do B] não foi suficiente para entender seu papel” no projeto de reformas do governo do PT nos últimos dez anos, Mário traz uma observação rica e concisamente importante. Não entrarei na questão que o Mário comentou sobre a opção pela socialdemocracia do partido, mas apenas observarei que a fertilização do novo não surge em função da não compreensão de uma participação histórica e que atualmente se faz necessária pela nítida falta de uma força à esquerda da própria esquerda no país.

“Sem o vigor e a virilidade de outrora”: novamente Mário nos coloca uma impotência de nosso partido, este que deveria estar à frente dessa força à esquerda que precisamos. Como eu disse acima, vivemos um momento de transformações que sim, como nunca antes na história desse país, são progressistas e que precisam se manter para que avancemos principalmente em soberania. As ruas mostraram que há insatisfação para avançarmos mais e mais rapidamente, só que defendo o pensamento de que o processo é lento e que a necessidade urgente é o empurrão à esquerda.

Esse movimento precisa se dar com a fortificação do nosso partido, historicamente compromissado com essa ação. E o movimento é renovar suas fileiras, compreender detidamente o que significa uma militância no século XXI, compreender mais de perto a comunicação mais adequada com os trabalhadores e mais, com os microempresários, pequenos produtores agrícolas, trabalhadores informais e os autônomos. Precisamos ir além dos sindicatos, centros acadêmicos, grêmios estudantis e lideranças comunitárias. Precisamos compreender que a nossa comunicação deve estar relacionada com as tecnologias, os debates virtuais e a multiplicidade de opiniões.

Reforço que o papel do partido precisa estar fortificado na sua comunicação, que é por onde passa o trem da História atualmente, e que segundo o companheiro Mário, parece que estamos perdendo, concluo que ainda não, até mesmo porque hoje a analogia mais adequada para o transporte da História é o avião, cuja decolagem precisa obviamente de um piloto, apenas precisamos do brevê e assumir a cabine antes da decolagem, assumir como verdadeiros militantes!

03 julho 2013

Estado e Comunicação

O texto aqui surge da reflexão sobre a necessidade de uma compreensão do papel do Estado nos dias atuais, e como isso evidencia a luta de classes e pode, com mecanismos de comunicação, aprimorar a organização dos trabalhadores. A referência é o livro de Lenin “O Estado e a Revolução”, por um lado como uma lanterna que ilumina o caminho para uma clareza dos conceitos fundamentais e assim fortalecer as bases do conhecimento do Estado, e por outro lado num aspecto mais crítico a essa obra em função de se abrir o debate para a realidade do século XXI. Iniciarei com o trecho de uma carta de Marx que é citada por Lenin nesse livro:

“O que eu fiz de novo consiste na demonstração seguinte: 1º que a existência das classes só se prende a certas batalhas históricas relacionadas com o desenvolvimento da produção; 2º que a luta das classes conduz necessariamente à ditadura do proletariado; 3º que essa própria ditadura é apenas a transição para a supressão de todas as classes e para a formação de uma sociedade sem classes.”

A análise de Lenin sobre essa passagem é interessante, ele destaca que a luta de classes não é o essencial do pensamento de Marx, até mesmo porque isso já havia sido desenvolvido por pensadores anteriores. Lenin destaca o seguinte:

“Quem só reconhece a luta de classes não é ainda marxista e pode muito bem não sair dos quadros do pensamento burguês e da política burguesa. Limitar o marxismo à luta de classes é truncá-lo, reduzi-lo ao que é aceitável para a burguesia. Só é marxista aquele que estende o reconhecimento da luta de classes ao reconhecimento da ditadura do proletariado. A diferença mais profunda ente o marxista e o pequeno (ou grande) burguês ordinário está aí. É sobre essa pedra de toque que é preciso experimentar a compreensão efetiva do marxismo e a adesão ao marxismo.”

Pois bem, vivemos atualmente em uma luta de classes e o caminho precisa ser direcionado à ditadura do proletariado, não temos as condições para a eliminação direta das classes e conforme exposto por Marx, isto seria uma terceira etapa exatamente sob a ditadura do proletariado. Faço inicialmente uma provocação: levando-se em conta a cultura capitalista imersa nos valores contemporâneos, sobre quais bases um marxista, por meio de um processo de comunicação, aproxima-se de um trabalhador assalariado comum e lhe orienta sobre a luta de classes vivida por todos nós e que, ao contrário do que esse trabalhador possa imaginar, o caminho para uma sociedade justa não passa pelo seu desejo de ascensão social, e que ele deverá fazer parte de uma revolução?

Obviamente que um marxista não é um pregador de praça pública, se bem que isso também pode ser necessário, mas a trajetória dos marxistas atualmente é pela sua organização, há um partido com uma orientação para a constituição da vanguarda que deverá conduzir os trabalhadores assalariados comuns para a revolução, para o caminho do socialismo. Assim, meu ponto de vista é que a comunicação socialista precisa ampliar para junto dos trabalhadores a compreensão do que é um Estado e como uma cidadania progressista estimula a vontade de participação e aí sim abrir caminhos para quais transformações, ou revoluções, podem realmente ser estabelecidas.

Segundo Lenin, há dois processos no caminho para o Estado sem classes, o que na verdade seria um não-Estado, pois o Estado existe como instrumento de opressão de uma classe sobre a outra, extingue-se as classes, o Estado perde sua função. O primeiro processo é a necessidade de uma revolução violenta para derrubar o Estado burguês ou capitalista; o segundo é o definhamento do Estado proletário ou ditadura do proletariado. A condução dos dois processos está nas mãos do proletariado ou classe trabalhadora. Lenin diz:

“A substituição do Estado burguês pelo Estado proletário não é possível sem uma revolução violenta. A abolição do Estado proletário, isto é, a abolição de todo e qualquer Estado, só é possível pelo ‘definhamento’”

Lanço outra provocação: será que a nossa comunicação está dando conta de deixar claro o significado desses dois processos (revolução violenta e definhamento)? Como adaptamos esses dois estágios para os dias atuais? O ponto de partida é a organização dos trabalhadores assalariados, incluindo aí autônomos e trabalhadores que possuem seus próprios negócios em escalas bem menores do que dos grandes capitalistas. Essa organização passa pela comunicação, fazer com que esses trabalhadores compreendam primeiramente a qual classe pertencem, como o Estado atual é opressor e por fim o seu papel como classe.

Eis que surge uma dificuldade, os valores da sociedade capitalista e de consumo, reforçados pelo neoliberalismo, leva ao individualismo mais agressivo, aquele em que o indivíduo se vê como não relacionado diretamente ao Estado, pois este se ausentou de um papel preponderante na sua formação; temos saúde, educação e lazer como bens privados, como mercadorias. O Estado se faz presente para esse indivíduo de formação capitalista apenas para a sua segurança, que nos dias de hoje, em especial no Brasil, recebe fortes críticas.

Outro aspecto que lança os cidadãos contra o Estado são os impostos, é quase senso comum que a carga tributária é abusiva e as pessoas gostariam muito de se afastar de suas relações com o Estado por conta dessa carga. Ainda segundo esses valores, o Estado não é reconhecido como um instrumento de opressão, pelo contrário, é visto como uma instituição fraca e que cada indivíduo é capaz de sobreviver sem ele. Ironicamente, há o sentimento em alguns cidadãos de que não há necessidade de viver com a presença de um Estado, sendo preferível sem ele e com os recursos capitalistas necessários.

O Estado oprime principalmente por conta de suas relações econômicas, pois faz assegurar os valores capitalistas que formam culturalmente o indivíduo, vivemos uma opressão cultural, norteada expressivamente pelo consumismo; “eu posso ter”, “eu posso pagar”. Quando Lenin fala de uma substituição violenta, enxergo que hoje isso não passaria necessariamente por armas e mortes, e sim excluir consideravelmente o apego ao consumismo. A luta hoje é ideológica e as armas são os mecanismos de comunicação.

A comunicação deve seguir o caminho para expor uma real compreensão da máquina do Estado nos dias de hoje. Lenin cita a máquina composta por uma burocracia administrativa e um exército permanente, que possuem o objetivo de defender os interesses da classe opressora. A revolução, segundo ele, visa destruir essa máquina e substituí-la por uma nova com a classe trabalhadora à frente. Acrescento que atualmente essa máquina possui ainda os meios de comunicação junto a ela, estes defendem os interesses lançando uma cruzada ideológica do individualismo, do consumismo e da vitória do capitalismo, quando bem sabemos que o sistema capitalista vive uma crise sem saída.

Lenin diz:

“É precisamente a pequena burguesia que se deixa atrair pela grande burguesia e subordinar-se a ela, graças a esse aparelho que dá ás camadas superiores do campesinato, dos pequenos artesãos, dos comerciantes, etc., empregos relativamente cômodos, tranquilos e honoríficos, cujos titulares se elevam acima do povo.”

Precisamos romper esse elo de atração, que hoje é fortificado ideologicamente pelos prazeres do capitalismo que, segundo a burguesia, venceu e se solidificou como modelo, ideologicamente o espaço para o socialismo está sendo minado. Antes de avançarmos na transformação do Estado há uma necessidade de vencer a luta ideológica. Como enxergo o caminho para a luta? Começarei novamente citando Lenin:

“A revolução capaz de arrastar a maioria do movimento só poderia ser “popular” com a condição de englobar o proletariado e os camponeses. Essas duas classes constituíam, então, ‘o povo’. Essas duas classes são solidárias, visto que a ‘máquina burocrática e militar do Estado’ as oprime, as esmaga e as explora. [...] sem essa aliança não há democracia sólida nem transformação social possível.”

O caminho se abre quando iniciarmos a verdadeira solidariedade entre as classes, quando for possível a compreensão, pelo próprio conjunto dos trabalhadores, de que eles formam um ‘povo’, e que essa constituição passa por um comprometimento solidário de classe. Nos dias atuais temos o contrário, não se busca uma solidariedade em função de um bem comum, a resolução dos problemas mais imediatos parece constituir a única pauta entre os trabalhadores, que enxergo como um reflexo direto da cultura consumista comentada mais acima. Como nos adverte Lenin, precisamos fortalecer essa aliança entre o conjunto de trabalhadores.

Mas qual comunicação é possível? Eis o nosso desafio como marxistas, por um lado é mais do que necessário um domínio de tecnologia, reconhecer que uma geração inteira está crescendo para tocar uma tela muito mais do que escrever num papel. Por outro lado, aprimorar e renovar os termos buscando uma melhor compreensão de conceitos fundamentais, entre eles o papel do Estado no século XXI, suas características primordiais, sua relação com o indivíduo culturalmente formado sob o capitalismo mais agressivo.

Para isso, o desafio nos lança para a nossa capacidade de organização, reunião de discussões capazes de promover o sentimento de reflexão e participação. Visando a reunião solidária dos trabalhadores, precisamos debater amplamente o Estado, suas constituições e instituições, e por quais mecanismos ele opera junto aos cidadãos. Precisamos buscar os meios para potencializar os encontros e as exposições. Não podemos ficar parados para incentivar apenas a agitação política, precisamos reunir, aglutinar para conversar e lidar com as contradições.

Vivemos numa sociedade da informação, estarmos intrinsecamente envolvidos com as suas próprias necessidades nos levará a ter mais armas para a luta. A derrubada violenta prevista por Lenin se concretizará quando fizermos cair as barreiras da ideologia capitalista cravadas atualmente na cultura e na informação. Devemos partir para dentro dos valores consumistas e miná-los por meio das nossas armas da comunicação. Precisamos nos preparar adequadamente.

26 junho 2013

Navegantes - Programa 2

Quando: 29 de junho de 2013
Onde: Editora FiloCzar - Rua Durval Guerra de Azevedo, 511 Pq. Sto. Antônio
Horário: 17h
Para saber mais sobre o Navegantes clique aqui.


"A CANGA"
PB / 12 minutos / 2001
Dir: Marcus Villar
Sinopse: Num descampado, no meio de uma lavoura seca, um velho agricultor obriga os filhos a colocar, nos ombros, uma canga de boi. A esposa e a nora também são forçadas a ajudar no trabalho. Fora de si, o velho perde o controle da situação e a família reage provocando um desfecho inusitado.

"DIAS DE GREVE"
DF / 25 minutos / 2009
Dir: Adriley Queiroz
Sinopse: Uma greve de serralheiros é deflagrada em uma periferia da capital federal. Neste período, muito mais que um despertar para uma consciência de classe, os operários redescobrem uma cidade e um tempo que não mais lhes pertencem.

"A HISTÓRIA DA ETERNIDADE"
PE / 10 minutos / 2000
Dir: Camilo Cavalcante
Sinopse: Acontecimentos que representam um amplo panorama da civilização ocidental e tudo que o ser humano é capaz, desde trucidar seu semelhante brutalmente até inventar a arte para libertar os sonhos estão presentes neste exercício visceral que expõe, sem concessões, a eterna tragédia humana.

"ACERCADACANA"
PE / 19 minutos / 2009
Dir: Felipe Peres Calheiros
Sinopse: Nos anos 1990, com a valorização do etanol e a expansão do latifúndio canavieiro, 15 mil famílias foram expulsas de seus sítios na zona da mata de Pernambuco. Maria Francisca decidiu resistir.

18 junho 2013

Crônica dos Olhos Profundos

Novamente uma necessidade, os olhos fundos de uma garota de 25 anos me dizem que algo está distante de mim. Meus músculos doem, o pescoço me dilacera a alma por meio da dor. Preciso pensar, concentrar... Ela está olhando para mim.

Ao encontro dela eu pensei, único objetivo mais lúcido naquele momento, meu cérebro errante e etilicamente amaldiçoado coordenava meu pensamento para tocá-la.

Foi então que percebi a sua distância, o quanto eu não era minimamente legível para a sua compreensão. Compreenderei melhor o seu sorriso do que o seu toque.

A realidade entre nós reina de forma absoluta.

Rudimentar é o sonho que nos alimenta, não exige nada apenas que nos aliviemos da própria realidade e a conduza conforme nossos anseios.

13 junho 2013

Dois Quarteirões Antes

Meu relato alguns minutos e dois quarteirões antes da intolerância policial ter reprimido com violência extrema a manifestação contra o aumento da tarifa de ônibus em São Paulo, conhecida como Revolta da Salada, e que seguia pacífica:

São Paulo, 13 de junho de 2013. 18:30h.

Acabei de passar no meio da manifestação na pça da República.

Tudo na paz.

Não nos deixemos apavorar por essa mídia que nos joga pra dentro de seus apocalipses.

Lojistas estão assustados, do meu lado o vendedor comparando com aquele dia do PCC em 2006, que também foi reflexo da datenização de nossos meios de comunicação.

Vamos celebrar nossa democracia em vez de criar fins dos tempos.

Um novo tempo começou.

Manifeste! Grite! Liberte-se!

TRAJETO

Saí do lgo do Arouche, cruzei a pça da república (no momento da passeata), rua 7 de abril, teatro municipal, viaduto do chá (fechado com a PM armada até os dentes), pça do patriarca (onde tomei uma bênção de sto antonio, padres estavam abençoando quem quisesse), rua direita, pça da sé, pça João mendes (por onde passou um ônibus elétrico pichado c/ os dizeres: Jovem, Comunista, Revolução), mais a frente meia dúzia de manifestantes pichavam uma agência da Caixa, pça da Liberdade, Kintaro (onde aprecio essa agradável noite que será completada com muito amor).

12 junho 2013

Precisamos não retroceder

Não fui um cara pintada, mas lutei, e muito, contra o nefasto neoliberalismo dos anos 90, fui militante antiFHC, mas não participei de passeatas e nem briguei com a PM. Apenas estudei, li a História e aprimorei meu conhecimentos políticos e históricos. 2002 representou uma virada fundamental em nosso país e considero que 2012 foi pra sampa. É ÓBVIO, repito, é ÓBVIO que há erros, tropeços e falhas. Pra isso temos uma democracia plenamente conquistada. Por favor, não vamos retroceder, estamos num caminho certo, vamos valorizá-lo e construir juntos, porque o neoliberalismo não descansa e está nos rondando. Lutemos por um humanismo e principalmente por diálogos, nem que seja para que eles ocorram com meus netos, mas que ocorram. Até a vitória sempre!

25 maio 2013

Elefante Vermelho

Recentemente, o ministro dos Esportes, Aldo Rebelo, foi o entrevistado do programa Roda Viva na TV Cultura e lá foi questionado sobre os estádios para a Copa do Mundo nas cidades de Manaus e Cuiabá, o questionamento se referiu principalmente à necessidade de possuir estádios modernos (diga-se padrão FIFA) em cidades cujo futebol local possui pouca expressividade no país, pois seus clubes jogam apenas a quarta divisão do Brasileirão.

Os estádios de Manaus e Cuiabá já são considerados por muita gente Brasil afora como verdadeiros elefantes brancos.

A resposta de Aldo, num viés de nacionalismo e integração nacional, foi mostrar que cidades da Amazônia e Pantanal merecem ver jogos da Copa e que isso não precisa ser privilégio apenas da região sul e sudeste, pois tal privilégio poderia até caracterizar preconceito. O ministro salientou também que esses novos estádios também serão arenas multiuso, o que levará mais espetáculos a essas cidades e com isso movimentá-las culturalmente e financeiramente.

Analisemos.

Fui criado em Manaus, sou apaxionado por futebol e durante a minha infância e adolescência assisti a três Copas do Mundo (82, 86 e 90), todas pela TV (com narração de Luciano do Vale, Osmar Santos e Galvão Bueno, respectivamente). Lembro que minha mãe sempre trocava a TV de casa por uma nova na época da Copa. Vimos o Caniggia receber o passe do Maradona e reforçar o nosso fiasco na Itália num aparelho Sharp de 20 polegadas. Alimentei desde criança um grande sonho de um dia poder ver uma Copa ao vivo.

Hoje moro em São Paulo, privilegiado por estádios e clubes de expressão, e caso tudo der certo (dinheiro, diponibilidade de ingresso e eu permanecer vivo até lá) realizarei o sonho de infância utilizando meu bilhete único no metrô. E se tudo der mais certo ainda ($$) farei questão de ver um jogo da Copa no Vivaldão (ops, Arena Amazõnia, que é, argh, um nome escroto, burguês, importação medíocre, etc, etc, etc).

Depois de tantos parênteses, o que eu quero dizer é que concordo com Aldo Rebelo de que sim, essas cidades, independentemente do que representa seu futebol no país, devem receber jogos da Copa, em 2014 um adolescente de 15 anos poderá ter acesso a isso em Manaus, coisa que eu não tive, fico feliz por ele e por esse Brasil mais democrático e igualitário que vem sendo construído nos últimos 10 anos.

Agora, o que eu não concordo é que essas vantagens apontadas por Aldo maquiem problemas crônicos que a realização dessa Copa está nos trazendo. O ministro, assim como eu, é do PC do B, partido da base do governo federal, portanto um militante com pensamentos progressistas, somos responsáveis por uma análise crítica e precisa dos fatos. A defesa de Aldo de que a Copa é importante para o país por X e Y deveria seguir junto com um ataque reconhecendo que as propostas de modificações urbanísticas, principalmente de mobilidade urbana, foram jogadas no lixo.

E o meio? O meio de campo é a ação da política, onde a disputa é mais delicada. O trabalho do ministro Aldo tem sido exemplar, acredito que sua força política tenha feito valer muitos dos interesses do país e ele busca muito isso em suas ações. Os problemas no nosso país não são os elefantes, assim como também não são os tomates, temos que enxergar aqueles seres invisíveis que apenas desejam se beneficiar de obras públicas sem a compreensão de que o termo 'público' deve ir na direção de um coletivo e não somente de privilegiados.

Sem dúvida alguma eu ficaria muito mais feliz que o adolescente de 15 anos de idade em Manaus utilizasse um transporte público muito melhor do que eu usava em 1990, mas por lá pouca coisa mudou. Troco isso por qualquer estádio ou copa do mundo. Em Manaus será feriado em dias dos jogos da Copa, isso é uma vergonha!

Um bando de abutres que também são conhecidos como empreiteiros, viram na Copa do Mundo um único objetivo: enriquecer de forma grosseira e indigesta. Muito se falou que teríamos um legado urbanístico como Barcelona, Sindey e outras cidades e países que receberam competições como Copa e Olímpiada. Cadê?

Os estádios serão elefantes brancos não por conta do futebol praticado em Cuiabá e Manaus. E sim por conta de que eles foram construídos para não somente agradar o padrão FIFA, mas também os bolsos de construtoras e investidores da construção que caíram como abutres nos orçamentos superfaturados para essas construções.

Poderíamos ter estádios mais modestos e eficientes, que após a Copa atendessem perfeitamente às realidades locais, seja para futebol, seja para eventos. Não sou contra pessoas ganharem dinheiro. Sim, a vinda da Copa seria para favorecer economicamente profissionais da construção, mas também para favorecer socialmente as populações das localidades, o momento do ps nos permitiria mostrar a força econômica agregada a uma vontade política popular e social.

Mas vontade política parece não ganhar força quando culturalmente vivemos sob o individualismo e consumismo agressivos.

Precisamos de um elefante vermelho que realmente incomode aqueles que enxergam apenas seu próprio umbigo.